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Militares e a crise do governo Bolsonaro

Na maior festa popular do País, o carnaval, a insatisfação popular contra o governo de Jair Bolsonaro foi entoada em alto e bom som em todas as regiões brasileiras, em manifestações de repúdio à pessoa do presidente. Ao completar dois meses de governo, o ex-capitão do Exército tornou-se recordista de impopularidade no início de mandato e acumula tropeços em declarações bizarras e impróprias para um chefe de Estado, além de escândalos de corrupção entre seus correligionários e familiares. É nesse clima de crise que o governo precisa garantir a aprovação da Reforma da Previdência, sua tarefa mais urgente e desafiadora, pois, para cumpri-la, o representante da extrema-direita precisa articular politicamente os interesses fisiológicos de um Congresso Nacional fortemente pressionado pela população que sempre rejeitou a Reforma e que, agora, já mostra rejeição ao governo. 

 

Militares com “cartas na manga”

 

A crise política que se instalou no Brasil desde a derrubada da presidenta eleita, Dilma Rousseff, em 2016, é consequência direta da crise econômica mundial que, desde 2008, tem exigido que os governos implementem políticas de ajustes para aumentar a exploração dos trabalhadores e, no caso de países de economia dependente, como o Brasil, destruir a economia nacional em favor dos interesses imperialistas. Diante da crise, mesmo a democracia burguesia, que é a ditadura da elite econômica, de uma minoria sobre a maioria da massa de trabalhadores, não conseguiu fazer um candidato a seu gosto e teve que apostar na eleição de uma figura caricata que representasse, de forma bastante confusa, o repúdio do povo à política tradicional. 

Em uma eleição marcada pela retirada do candidato preferido do povo, Luís Inácio Lula da Silva, como principal estratégia golpista da direita, Bolsonaro foi festejado como vencedor pela imprensa corporativa que agora se organiza em campanhas contra a figura do presidente, enquanto defende as medidas econômicas de seu super ministro Paulo Guedes. A situação se mostra mais caótica a cada dia. Enquanto cresce a desmoralização de Bolsonaro, do PSL e das operações golpistas que o levaram ao poder, aumenta a pressão dos setores econômicos interessados nas reformas propostas por Guedes. 

Por isso, uma das últimas supostas “gafes” do presidente deve ser levada a sério. Em um evento para militares, Bolsonaro afirmou que “democracia e liberdade só existem quando a sua respectiva Força Armada assim o quer”. Uma afirmação extremamente agressiva, que fere os princípios constitucionais e que talvez não tenha sido proferida nem durante a Ditadura Militar, iniciada em 1964. 

Muitos analistas considerados progressistas trataram a declaração como mais uma das inúmeras “imbecilidades” proferidas pelo presidente, deslocadas da realidade. Porém, o fato dela ter sido alvo de reação negativa entre os próprios militares revela que há acordo em torno da campanha pró-militar, que pretende transformar os militares no setor “sensato” do governo.

Tanto é assim que, nos últimos dias, Bolsonaro escalou um militar para coordenar a estrutura de mídias digitais e a comunicação oficial do Palácio do Planalto, após polêmicas que envolveram até a publicação de um vídeo pornô por parte do presidente. A decisão, tomada no último dia 11 de março, deixa claro que a presença forte dos militares no governo tende a crescer conforme a crise política se aprofunda. Inclusive, foi ao lado de dois generais, Otávio Rêgo Barros e Augusto Heleno, que o ex-capitão tentou mostrar ao público, em rede nacional, que a fala sobre democracia e Forças Armadas fora mal interpretada. 

A preocupação dos militares não está, obviamente, na interpretação que se fez da frase, mas no que ela revela de verdadeiro na política atual e que precisa ficar oculto. 

Além de um general como vice, cerca de uma centena de pessoas com origem nas Forças Armadas ocupam postos em ministérios e estatais na gestão de Jair Bolsonaro. De acordo com o site GaúchaZH, 46 militares estão em posições estratégicas no organograma, com a palavra final sobre políticas decisivas, como extração de minérios, modernização de comunicações, construção de estradas, manutenção de hidrelétricas e questões indígenas. Também atuam em gerências na Petrobras, Eletrobras e Zona Franca de Manaus, gestão de recursos hospitalares, na presidência dos Correios (ECT), na segurança pública e agências de monitoramento e contraespionagem. 

Ainda de acordo com o GauchaZH, mesmo em ministérios não liderados pela caserna, existe maior número de militares em postos de comando do que de civis. Três militares de alta patente estão na cúpula da Caixa. E a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), ligada ao Ministério da Justiça, é ocupada por outros quatro. O ministério tem também um militar da Aeronáutica como assessor técnico do ministro Sérgio Moro.

Os militares não ocupavam postos relevantes na cúpula do governo brasileiro desde 1985, quando se encerrou o mandato do General Figueiredo, último presidente do período da Ditadura.

A presença dos militares em setores estratégicos do governo comprova o temor da direita golpista em não conseguir, através das instituições democráticas, levar a cabo seus planos de austeridade. Longe de ser o “lado sensato” do governo, como muitos, até na esquerda, andam apregoando, os militares são o que são: o órgão repressivo do Estado burguês, acionado sempre que a situação ameaça “sair do controle” da burguesia. 

Não por acaso, os militares, em todo o mundo, foram responsáveis por ditaduras violentas e sangrentas. Após o golpe de Estado de 2016 e antes da eleição de Bolsonaro, diversos generais deram declarações públicas de que o Exército estaria disposto a “controlar a situação”. Sua forte presença neste governo em frangalhos apenas confirma esta disposição.

O significado da participação dos militares na política não tem nada a ver com o combate à corrupção, com a segurança da população ou o controle sobre um governo “ruim”. Ele está relacionado à necessidade de ampliação da repressão para garantir que o aumento da exploração contra a classe operária ocorra com o mínimo de resistência. A organização da classe operária é a única força capaz de barrar esta investida.
 


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