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Eleições na Espanha: uma nova esperança desponta no horizonte?

No dia 29 de abril de 2019, houve na Espanha eleições gerais para composição do quadro político das Cortes Gerais e formação de um novo governo no país, sendo a terceira eleição nos últimos quarenta meses, devido à instabilidade política e econômica do país. O partido que conquistou maioria absoluta de assentos tanto no Congresso dos Deputados (123), quanto no Senado (141), foi o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), de centro esquerda. O partido que mais perdeu assentos no parlamento foi o Partido Popular (PP), de direita, considerado pela população o responsável pela crise econômica. O PP obteve seu pior resultado desde a redemocratização espanhola, após a ditadura franquista (66 assentos no Congresso e 73 no Senado). A forte repressão ao referendo em que o povo Catalão decidiu por sua independência, feita pelo governo do PP, em 2017, deixou parte da burguesia preocupada com uma perigosa radicalização nas regiões que reivindicam sua independência em relação à Espanha e a fez abandonar o apoio à sigla.

Houve queda no número de cadeiras do Congresso ocupadas pelo partido de esquerda PODEMOS (42 cadeiras, perdendo 29), que, ao que tudo indica, teve parte de seus votos transferidos para o PSOE. Outra mudança foi o aumento dos lugares ocupados pela Esquerda Republicana Catalã (15 cadeiras, com aumento de 6), provavelmente ocasionado pelo evento de tentativa reprimida de independência do território catalão. Outro partido que aumentou suas cadeiras no congresso foi o CIUDADANOS (57 cadeiras, com aumento de 25), um novo partido de direita ligado à velha receita liberal, para o qual parte da burguesia (empresários, líderes sociais e famílias de classe alta e média) transferiu seu voto na esperança de evitar a formação de uma Frente Popular entre a esquerda vitoriosa e os partidos independentistas bascos ou catalães. A novidade foi a conquista de 24 cadeiras no congresso e uma no Senado por um partido de extrema direita, o Vox, fenômeno que não ocorria desde 1979.
Em uma leitura conjunta entre números de votos e posicionamento político, no espectro ideológico em que se distribuem os partidos, nota-se que os partidos de direita perderam as eleições, mas ainda têm elevada votação, além de uma guinada para a extrema direita e para a adesão a políticas liberais e de austeridade, mostrando uma fratura da sociedade espanhola (75% dos eleitores compareceram para votar, somente 2% votaram nulo ou branco), típica de épocas de crise profunda.

Da totalidade de votos (levando-se em conta os maiores partidos), divididos por posições de esquerda e direita, o que possibilita preconceber uma possível formação de bloco de governo e de oposição, tem-se 12.198.608 votos para a esquerda (PSOE, PODEMOS, ERC), que passa a ocupar cerda de 180 cadeiras no Congresso, contra 11.169.796 (PP, Cs, VOX), que ocupará 147 cadeiras; ou seja, é provável que o PSOE consiga formar um bloco de consenso para governo, entretanto, possivelmente enfrentará uma oposição forte e com posicionamentos extremados de direita.

 

PSOE: retórica de centro

 

Do lado da esquerda, o deslocamento de posição se deu para o centro, devido à retórica eleitoral usada pelo PSOE. Esta combinava um discurso socialdemocrata a um discurso contra o fascismo, colocando-se favorável à manutenção dos direitos sociais, contra as políticas de austeridade, pela elevação do salário mínimo, igualdade de gêneros e negociação de maior autonomia para a Catalunha (não reconhecendo, entretanto, sua independência) e acusando os demais partidos de direita de serem coniventes à plataforma política do VOX, representante do chamado neo-fascismo. Assim, o deslocamento da esquerda para o centro se deu mediante propaganda antifascista e defesa de uma socialdemocracia, contra medidas de austeridade.

Nessas eleições o PSOE ocupou uma posição ambígua. Por um lado reuniu as expectativas da esquerda, ou mesmo progressistas, em manter o regime democrático, com aspectos de socialdemocracia, fortalecido pelo desastre que foi a experiência das políticas de austeridade do PP. Em conjunto a isso, buscou evitar a chegada da extrema direita ao governo.

Por outro lado, a posição histórica assumida pelo PSOE, desde fins da década de 1970 (quando abandonou o marxismo, em um golpe interno), é enquadrar a perspectiva de avanço político dos trabalhadores nos limites impostos pelo grande capital financeiro internacional com suas instituições imperialista (tais como a OTAN e o FMI). Dessa forma, o PSOE assumiu a tarefa histórica de impedir a independência política da classe trabalhadora, sua solidariedade internacional e seu projeto revolucionário, assim como a fez defender os interesses do grande capital em troca de uma simulação de bem-estar social. Esse reduzido Estado de bem-estar social vem se dissolvendo desde que o capital entrou em colapso e não consegue mais se autovalorizar sem destruir as forças produtivas, inclusive a qualidade de vida dos trabalhadores. Ou seja, a promessa do PSOE não se sustenta sem uma mudança radical na produção e distribuição de riquezas.

Cabe à classe trabalhadora fortalecer sua organização, mediante o fortalecimento das entidades históricas de luta popular e trabalhista, para que estas sirvam de meio para a conquista da independência política e retomada do projeto de mudança radical, representados pela formação do partido revolucionário a superar a paralisia e submissão dos partidos da esquerda burguesa, como o PSOE faz ao capital. Para tanto, é preciso acompanhar as expectativas progressistas da população, que no momento se resumem em defender o regime democrático contra as políticas de austeridade, o neo-fascismo ultraliberal e a limitação da soberania do povo catalão, ao mesmo tempo em que se deve mostrar os limites do PSOE em corresponder às esperanças que lhes são depositadas. Limites estes correspondentes às relações que mantém com o grande capital e a manutenção de seu regime atual de exploração.

 


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