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Mapa da Violência: materialização do racismo no Brasil

A tentativa de hierarquização das raças promovida pelos colonizadores portugueses deixou uma herança racista solidificada no Brasil, que serve como pilar para o sustento da trágica realidade vivida ainda hoje pela população negra. A abolição da escravatura feita tardiamente no País, e por interesses capitalistas, não contribuiu de fato na construção de uma sociedade sem segregacionismo. O racismo estrutural dos dias atuais, de forma dissimulada e muitas vezes “imperceptível”, torna ainda mais difícil o reconhecimento pela população que essa realidade escravocrata ainda existe no seio da sociedade e que precisa ter a devida atenção para se criar políticas públicas para  remediar, ao menos em partes, esse espólio colonial eurocentrista e imperialista.

Os números do mais recente Atlas da Violência, divulgados em junho pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), provam o quanto a realidade brasileira está na contramão em relação à diminuição da violência, sobretudo contra negros. Segundo o levantamento, foram registrados no Brasil, apenas em 2017, aproximadamente 65.602 homicídios, sendo que destes, 49.505 são de pessoas negras, o que representa 75,4% do total de assassinatos. Ao analisar separadamente os homicídios praticados contra pessoas negras e não negras é possível visualizar que os índices são inversamente proporcionais, enquanto às taxas de homicídios de homens e mulheres negras crescem a de não negras expressam declínio.

Os oitenta tiros disparados por militares contra um músico negro e sua família em frente a um posto do Exército, no Rio de Janeiro; o enforcamento de um jovem negro por um segurança de supermercado, morto na frente de sua mãe e expectadores; o assassinato de uma vereadora negra defensora de direitos civis; o desaparecimento de um ajudante de pedreiro negro após ser conduzido por policiais, entre inúmeros outros casos são exemplos recentes de como esses índices se materializam. Importante ressaltar que os dados do IPEA também revelaram que deste total de homicídios, 47.510 foram cometidos por arma de fogo. Ou seja, 72% do número total de homicídios.

Além de defender a posse de armas de fogo para as elites, uma das propostas do governo Bolsonaro é criar uma defesa jurídica, chamada “excludente de ilicitude”, para que policiais em serviço que cometam homicídio, por exemplo, não sejam punidos pelo ato caso o juiz entenda que ele se encaixa nas regras do dispositivo jurídico. Esta medida nada mais é do que uma licença para o policial matar impunemente. Tal projeto vai na contramão para solucionar o problema do contexto genocida que é apresentado pelas pesquisas de violência. Este projeto faz parte da promessa de campanha de Bolsonaro de diminuir a criminalidade "matando bandidos". Quem entrará na mira dos fuzis policiais que, agora, poderão agir sem nenhum receio, será a mesma parcela da população que já é assassinada pelo braço armado do Estado: a população negra e pobre.

Só para se ter ideia, segundo dados do Fórum de Segurança Pública no Brasil, apenas no ano de 2013, ainda sem o "excludente de ilicitude" proposto por Bolsonaro, as intervenções policiais civis e militares foram responsáveis pela morte de 1.279 pessoas. É evidente que caso essa proposta seja aprovada, a tendência é que esse número aumente, principalmente em relação aos homicídios de pessoas negras, que representam os maiores índices de baixa renda e escolaridade e estão mais presentes nas áreas de risco. Para a ideologia defendida pelo racismo estrutural, praticada por muitos policiais que compõem as diversas instituições de segurança pública no Brasil, preto, pobre e favelado é sinônimo de “vagabundo” e “bandido”.

Outro sintoma do racismo enraizado na sociedade brasileira é o acesso da população negra à educação. O Relatório das Desigualdades de Raça, Gênero e Classe, realizado em 2018, que cruzou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), apurados em 2016 pelos pesquisadores Luiz Campos, Danilo França e João Feres, mostrou que a média de anos de escolaridade também apresenta discrepâncias entre brancos, negros e pardos. Segundo a pesquisa, brancos estudam, em média, 10 anos durante a vida, enquanto pretos e pardos apenas oito anos. Sobre o ensino superior, a pesquisa mostrou que 39% da população Brasileira possui ensino superior completo e deste índice 22% são brancos, enquanto pretos e pardos representam 9% e 8%, respectivamente.

“Misteriosamente”, os números acima expostos não ocuparam manchetes jornalísticas na imprensa burguesa. Não houve nenhuma nota presidencial, muito menos anúncio de projeto público que pudesse contribuir na redução dos números da violência. O saudosismo escravocrata é evidente no Brasil e essa “negligência” em relação ao genocídio da população negra é reflexo dos interesses do capitalismo, que mantém a hierarquização das raças para conservar e solidificar ainda mais um de seus mais importantes pilares: a escravidão e suas heranças que, no caso brasileiro por ter a maior parte da população negra e descendente de escravizados, lhe permite espoliar ainda mais a maior parte da população.


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