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O drama da pandemia na África

Se a pandemia de COVID-19 causou uma crise sanitária sem precedentes no mundo, inclusive nas grandes potências, na África, tratada como periferia do mundo capitalista, a situação é no mínimo desesperadora. A República Centro-Africana, por exemplo, afirma que no País só há três respiradores (máquinas de ventilação mecânica, essências para pacientes com Covid-19 em estado grave), para uma população de cinco milhões de pessoas. Em Burkina Faso, a proporção é de 11 respiradores para 19 milhões de cidadãos; já em Serra Leoa, são 18 para 7,5 milhões.

Especialistas já vinham alertando sobre uma tragédia de imensa proporção que a pandemia do novo coronavírus poderia causar no continente africano. O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom, chegou a dizer que a África deve se preparar para ''o pior''. Muitas outras instituições internacionais também emitiram alertas que assinalaram que ''o desastre é iminente'' no continente, e pode se transformar em uma ''tempestade brutal'' se medidas urgentes não forem tomadas.

 

Sistema de saúde precário

 

Segundo projeções, o contágio na África do Sul está com um atraso de duas a três semanas em relação à Ásia e Europa. Constantemente, diferentes ONGs e instituições internacionais aconselham os governos africanos a aplicarem medidas como o confinamento e fechamento de suas fronteiras.

A África do Sul, por exemplo, implementou a quarentena obrigatória e anunciou que começará a fazer milhares de testes de casa em casa. A Nigéria confinou os moradores de duas das suas cidades mais populosas, enquanto a Gâmbia fechou suas fronteiras. No Quênia, adotaram o toque de recolher.

Mas nada disso parece ser suficiente. ''Os casos estão aumentando muito e com muita rapidez'', afirmou a representante da OMS na África, a nigeriana Mary Stephen, em entrevista veiculada no portal de notícias G1. "Devemos impedir que as mortes aumentem e, para isso, precisamos ser mais proativos e implementar medidas preventivas e de controle com urgência", acrescenta.

O sistema de saúde precário é um dos grandes problemas que a África tem para enfrentar a pandemia. Faltam leitos, unidades de terapia intensiva (UTI), médicos especialistas e equipamentos essenciais para enfrentar o vírus.  ''Por isso é tão importante quebrar a cadeia de transmissão, antes que seja tarde demais'', ressaltou Stephen.

Segundo a epidemiologista, Anna Roca, que vive na África há dez anos trabalhando para a Unidade de Gâmbia da Escola de Higiene e Medicina Tropical da Universidade de Londres (LSHTM), também em entrevista veiculada no G1, “Estratégias para lidar com a pandemia, como achatar a curva de contágio, foram projetadas na Europa ou em países de alta renda e é muito difícil pensar que possam ser implementadas nesses países Africanos [...]. Aqui o sistema ficará saturado muito mais cedo do que nesses países; entrará em colapso muito rapidamente".

Segundo a ONG Comitê de Resgate Internacional (IRC), a Somália só tem 15 leitos de UTI para quase 15 milhões de pessoas; o Mulaí, 25 leitos para 17 milhões e a Uganda, 55 para 43 milhões. Em um dos sistemas de saúde mais precários do mundo, teme-se que a disseminação da pandemia tenha efeitos devastadores, colocando em risco também milhões de pacientes que sofrem de outras doenças, como tuberculose, HIV, malária e desnutrição.

 

Más condições de higiene e falta de água

 

Na África existem muitas áreas em que falta o básico, como água e sabão, o que impossibilita a melhor prevenção contra o novo coronavírus. Segundo o Fundo das Nações Unidas para infância (UNICEF), na região da África subsaariana, 63% das pessoas que vivem em áreas urbanas (258 milhões de pessoas) não têm condições de sequer lavar as mãos.

Na África Ocidental e Central, mais de um terço das pessoas ainda não têm acesso à água potável, o que faz com que as condições de higiene sejam extremamente frágeis. Na Gâmbia, para se obter água é preciso sair de casa e coletá-la em torneiras públicas, o que faz com que a higiene não seja a prioridade, pois não há água suficiente para lavar as mãos continuamente. Além disso, a alta densidade populacional de algumas áreas torna ainda mais difícil conter a pandemia.

Em Nairóbi, capital do Quênia, por exemplo, existem favelas como a chamada Mukuru, onde mais de meio milhão de pessoas vivem em casas feitas de papelão ou plástico, sem ventilação ou drenagem e nem coletam resíduos, fórmula perfeita para a propagação de doenças. "Não podemos separar uma criança da outra em caso de infecção. Não temos espaço. Não há quartos aqui", disse uma das moradoras deste local, Celestine Adhiambo, à BBC.

 

Impacto dramático na economia

 

A crise do coronavírus expõe um dos maiores problemas dos países Africanos, a enorme desigualdade social. A África é o continente mais pobre do mundo: 1/3 de seus habitantes vivem com menos de um dólar ao dia, o que é definido abaixo do nível de pobreza pelo Banco Mundial. O continente vive com grande avanço de doenças, agravamento de misérias e conflitos armados, o que leva esta região a um caos constante. O continente africano é um dos mais pobres do mundo – o PIB total da África é apenas 1% do PIB mundial e o continente participa de apenas 2% das transações comerciais que acontecem no mundo.

A possibilidade de criar pacotes econômicos que ajudem as pessoas a lidar com a crise é vista como uma possibilidade muito remota, as pessoas não poderão parar de trabalhar porque não terão nada para comer, uma vez que estas pessoas ganham apenas para sobreviver dia após dia e não existe a possibilidade de “poupar”. A maioria das trocas comerciais é informal, o que faz com que o impacto de um isolamento seja muito grande e rápido. Neste sentido, as medidas de isolamento já estão afetando economicamente países da região.

Neste momento de pandemia, com instabilidade política e econômica intensa, é ainda mais difícil que economias pobres gerem riquezas para a população. Nem mesmo as “migalhas” que os países de alta renda davam, desta vez, desta vez não ocorrerá, já que a crise é mundial. Assim, fica ainda mais evidente que não há saídas para o continente africano que passe por dentro do sistema capitalista. A solução, necessariamente, é a destruição deste sistema que sempre subjugou o continente à condição de periferia do mundo, explorando tal população até a “última gota”.

 


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