No último dia 10, o Congresso Nacional aprovou o texto substitutivo ao Projeto de Lei nº4.372/20, que trata da regulamentação do Fundeb permanente, apresentado pelo Deputado Felipe Rigoni (PSB-ES). O texto garante a ampliação da drenagem de recursos públicos via entidades conveniadas e/ou parceiras com o poder público, inclusive com destinação adicional de recursos para os serviços nacionais de aprendizagem, que atendem poucos e, não raras vezes, cobram mensalidades. Seguindo a vontade do governo, os parlamentares incluíram a possibilidade de repasse do fundo para escolas privadas sem fins lucrativos, como as confessionais (ligadas a igrejas) nos ensinos médio e fundamental, em até 10% do total de vagas ofertadas. Além disso, o texto aprovado permite o pagamento de profissionais que trabalhem nas instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas - privadas e sem fins lucrativos - com a parte dos recursos destinada originalmente ao salário de profissionais da educação.
Em 25 de novembro de 2020, por meio da portaria interministerial nº 3, o governo de Jair Bolsonaro, havia alterado os parâmetros operacionais do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) para o exercício de 2020, projetando, junto com outras medidas de arrocho fiscal, a desestruturação da escola pública brasileira, a partir de 2021. Com a medida, o piso salarial do magistério, que tinha atualização prevista na ordem de 5,9% para 2021, agora terá reajuste zero.
Após derrota sofrida na aprovação da Emenda Constitucional nº 108, que estabeleceu o Fundeb permanente, o governo busca, por meio de medidas autoritárias, impor o desinvestimento na educação pública, com objetivo de favorecer os mecanismos de privatização já em andamento. Grande parte dos estados e municípios brasileiros serão imensamente afetados com desequilíbrios orçamentários. A gestão Bolsonaro já contingenciou mais de 90% dos recursos do MEC destinados à educação básica em 2020 (exceto a complementação obrigatória ao Fundo da Educação Básica) e propôs, no orçamento federal para 2021, a supressão de cerca de outros R$ 5 bilhões originalmente vinculados ao MEC.
Mantendo sua política negacionista em relação à crise sanitária, o governo federal tenta impedir a aprovação de projetos de lei no Congresso que pretendem incluir recursos da União no financiamento educacional para superar os efeitos da pandemia (PL 3.165/20 e outros). Foram vetados, por exemplo, dispositivos da Lei 14.040, que destinavam recursos do ''Orçamento de Guerra'' para financiar as redes escolares estaduais e municipais durante e após a pandemia da Covid-19. Enquanto isso, apoia a proposta parlamentar, prestes a ser protocolada, que visa flexibilizar o cumprimento da vinculação mínima constitucional à educação, insistindo em pautar a desvinculação permanente, total ou imparcial, dos recursos constitucionais destinados à educação.
Em um momento em que o desemprego atinge taxas recordes (14,6%) e a inflação solapa a renda dos trabalhadores (24,5% ao ano de acordo com o Índice Geral de Preços medido pela Fundação Getúlio Vargas), o governo, ao invés de alavancar a economia, o emprego e a renda no Brasil, encaminhou ao Congresso Nacional um projeto de Reforma Administrativa para diminuir postos de trabalho do setor público, privilegiando poucas carreiras ''típicas do estado'' e apontando para a privatização das políticas essenciais, como as de saúde e educação. Os servidores públicos são o alvo dos ataques do governo e foram penalizados na pandemia por meio da ação insana de Guedes/Bolsonaro na aprovação da Lei Complementar nº 173, que, em troca de apoio financeiro ao combate à pandemia, exige o congelamento de salários e das progressões nas carreiras dos servidores públicos das três esferas e também proíbe a contratação de pessoal ou a realização de concursos públicos até dezembro de 2021.
Nos efeitos práticos da Portaria Interministerial n° 3/2020, destacam-se dois pontos cruciais:
1. Todos os municípios brasileiros que recebem complementação estadual do Fundeb e os entes públicos (estados e municípios) que recebem complementação federal terão que devolver parte dos recursos recebidos desde janeiro de 2020.
Tal medida poderá gerar colapso em várias redes de ensino. Nem a expectativa de ganho com percentual extra de 2% da complementação da União para 2020 irá suprir as perdas em consequência da redução de 8,7% no custo aluno ano do Fundeb 2020, somadas à redução das receitas tributárias nos estados, DF e municípios e a relutância da União em repassar recursos extras para financiar a educação em todo o território nacional. Há o risco das administrações públicas não conseguirem reabrir suas escolas e, muito menos, honrar os compromissos salariais com seus servidores públicos.
2. O piso salarial do magistério que tinha atualização prevista na ordem de 5,9% para 2021, agora terá reajuste zero.
Enfrentando a realidade de salários historicamente defasados, pois muitos governos estaduais e municipais não repassam o reajuste do piso aos professores anualmente, como é o caso do estado de São Paulo, os profissionais da educação assistem a situação piorar com o desmonte, pelo governo federal, da política de valorização salarial garantida pela Lei n° 11.738, de 2008, que instituiu o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica.
A aprovação do Fundeb permanente não trouxe nenhuma garantia de barrar a intenção de desinvestimento na Educação do governo Bolsonaro. A Portaria 3/2020 deve ser revogada e é preciso exigir uma política de reajuste do Piso (fixando, por exemplo, o INPC + percentual de ganho real) para superar minimamente a histórica desvalorização salarial dos professores brasileiros em comparação a outros profissionais ou mesmo a docentes de outros países, conforme apontam as pesquisas da OCDE.
Sindicatos de professores e Centrais Sindicais precisam organizar a luta nacional em defesa da escola pública, com gestão pública, da valorização dos profissionais da educação e da destinação dos recursos públicos exclusivamente para a Educação Pública. A paralisia diante de tantos ataques é consequência da crise das lideranças burocratizadas e cabe aos trabalhadores pressionarem suas organizações de luta para o enfrentamento ao desmonte das políticas públicas que servem aos interesses do povo.