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O que está por trás da execução da vereadora do PSOL?

A vereadora do PSOL, Marielle Franco, foi assassinada na noite da última terça-feira, dia 14, no bairro do Estácio, na Região Central do Rio de Janeiro. De acordo com a própria Delegacia de Homicídios, a principal linha de investigação é a de execução. Além da vereadora, o motorista do veículo, Anderson Pedro Gomes, também foi baleado e morreu. Já a assessora de comunicação de Marielle, que estava no carro, foi atingida por estilhaços. O homicídio ocorreu quando a vítima voltava de um evento chamado "Jovens Negras Movendo Estruturas".

O assassinato de Marielle Franco é um típico caso de execução sumária, quando a ação é direcionada e a vítima não tem direito à defesa. Não por acaso, ela foi alvejada com pelo menos quatro tiros na cabeça (a perícia encontrou nove cápsulas de balas no local). Vale destacar que no momento da ação, Marielle estava no banco de trás do carro, no lado do carona, num veículo que possuía vidros fumês, o que impedia a visualização dos bandidos. Ou seja, para conseguir efetuar os disparados com tal precisão, os assassinos teriam que, no mínimo, ter a posição exata das pessoas – a Polícia inclusive trabalha com a hipótese de os criminosos já estarem acompanhando o grupo por algum tempo.

Também chama a atenção o fato de os assassinos terem disparado contra o carro e fugido logo na sequência, sem levar absolutamente nada, o que mostra que não havia qualquer interesse em roubar, apenas em executar.

Outra grande “coincidência” é o fato de que um dia antes do assassinato, a vereadora havia denunciado a violência policial no Rio em suas redes sociais. Em uma das postagens, Marielle afirmou que: "Mais um homicídio de um jovem que pode estar entrando para a conta da PM. Matheus Melo estava saindo da igreja. Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe?". Quatro dias antes da morte, também pelas redes sociais, ela chegou a chamar o 41° BPM de "Batalhão da morte": "O que está acontecendo agora em Acari é um absurdo! E acontece desde sempre! O 41° batalhão da PM é conhecido como Batalhão da morte. CHEGA de esculachar a população! CHEGA de matarem nossos jovens". E mais: “Precisamos gritar para que todos saibam o está acontecendo em Acari nesse momento. O 41° Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro está aterrorizando e violentando moradores de Acari. Nessa semana dois jovens foram mortos e jogados em um valão. Hoje a polícia andou pelas ruas ameaçando os moradores. Acontece desde sempre e com a intervenção ficou ainda pior".

No dia 28 de fevereiro, a vereadora se tornou relatora da comissão destinada a acompanhar a Intervenção, que tinha por objetivo, nas palavras de Marielle, “fiscalizar o Poder Público, visitar territórios, colher dados, solicitar informações e organizar reuniões sobre a Intervenção no Município. Nós temos lado e somos contra essa Intervenção. Já nos posicionamos sobre isso. Sabemos que ela é uma farsa, com objetivos eleitoreiros. Por isso, vamos ocupar esse espaço cumprindo o nosso papel de fiscalização, enquanto legisladora municipal”.

A Anistia Internacional chegou a divulgar uma nota pública pedindo que o Estado faça uma investigação imediata e rigorosa do assassinato da vereadora. "Marielle Franco é reconhecida por sua histórica luta por direitos humanos, especialmente em defesa dos direitos das mulheres negras e moradores de favelas e periferias e na denúncia da violência policial. Não podem restar dúvidas a respeito do contexto, motivação e autoria do assassinato de Marielle Franco".


A ordem é matar


As execuções de políticos, ativistas sociais ou qualquer pessoa que “incomode” ou atrapalhe os planos das classes dominantes não é nenhuma novidade. A ação dos militares durante as ditaduras é o exemplo mais cabal dessa política. As prisões, “desaparecimentos” e torturas eram extremamente comuns. Para se ter ideia, um relatório oficial, divulgado em 2011, sobre a ditadura chilena,  a mais violenta da América Latina, mostrava que “o total de vítimas oficiais entre executados, desaparecidos e torturados durante os 17 anos que durou a ditadura de Pinochet (1973-1990) subiu para 40.280, apesar de entre os grupos de vítimas se estimar que a cifra possa superar os 100.000” (Portal G1).

Apesar de ainda não estarmos num período de terror aberto, as execuções não deixaram de nortear a política nacional. As próprias denúncias feitas por Marielle mostram a forma de agir da Polícia nos morros e favelas: executando e desaguando os corpos em valões.

Uma matéria divulgada pelo jornal El País, em junho de 2016, revelou que “Desde novembro, nove pré-candidatos e vereadores da região [na Baixada Fluminense, região metropolitana do Rio] foram executados a tiros. Muitos tiros e alguns em plena luz do dia. Nem todos os crimes têm relação, nem foram necessariamente motivados por disputas políticas – há um crime passional e uma briga de trânsito –, mas a brutalidade dos assassinatos escancarou os perigosos e aceitos vínculos entre o crime – milícias, tráfico e grupos de extermínio – e a política local”.

No dia da execução da vereadora, o portal de notícias G1 divulgou uma matéria onde denunciava que “dois milhões de pessoas no RJ estão em áreas sob influência de milícias (...). Quadrilhas estão em 37 bairros e 165 favelas da Região Metropolitana; diferentemente da década passada, quando estavam limitadas a 161 comunidades. Área de atuação dos milicianos equivale a 1/4 da cidade do Rio”.

Ainda segundo a publicação, o perfil desses grupos teria mudado à medida que se expandiam. Inicialmente eles eram formados “por policiais civis e militares, bombeiros e agentes penitenciários, além de alguns moradores (...). Atualmente, policiais, quando aparecem, estão assessorando a prática criminosa. O combate e, consequentemente, a prisão de antigos chefes levou as quadrilhas a deixarem a chefia desses grupos com civis e, em alguns casos, até traficantes. (...) ‘A característica deles de ex-agentes públicos já foi afastada. Eles [os milicianos] estão trazendo os soldados do tráfico para o seu lado e, consequentemente, você tem uma ação da milícia muito mais violenta porque, hoje, estamos falando de milícia e tráfico, tudo igual’, explica a promotora Carmem Eliza Bastos”.

Como estamos vendo, o que está colocado para o próximo período é a volta, de maneira mais organizada, dessa política de extermínio da população trabalhadora, dos movimentos sociais e sindical. O assassinato “misterioso” de uma vereadora que fazia críticas abertas contra a ação criminosa da Polícia e do Exército nos coloca a importante tarefa de organizar a classe operária contra essa investida da burguesia. Diante de todo o exposto, para nós está claro que o assassinato tem ligações diretas com a Intervenção Militar. Não descartamos a possibilidade de essa ter sido uma ação orquestrada entre o Exército e a Polícia Militar – uma tentativa de calar uma voz, que iria investigar e denunciar as atrocidades cometidas pelos militares. Tal execução explica bem o pedido feito pelos generais de garantias para que não haja outra “comissão da verdade”, pois as práticas serão exatamente as mesmas. Elas já começaram.

A esquerda deve se unificar nessa luta pontual, tirar um plano de denúncias, protestos e unificação nas ruas. É preciso organizar a ação direta das massas contra a ação da direita fascista.


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