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A falência da III Internacional

A vitória da Revolução Russa, em 1917, foi um grande triunfo para a classe operária internacional. Os bolcheviques demonstraram que era possível destruir o poder da burguesia e impor a ditadura do proletariado, a forma mais avançada de democracia. A euforia dominou os partidos socialistas e os movimentos de esquerda em todo o mundo. A expropriação da propriedade privada na Rússia causou grande medo na burguesia mundial, que formaram exércitos para atacar a revolução. O medo virou pânico quando, em 1919, por iniciativa de Lenin, foi fundada a III Internacional que criava um partido mundial centralizado e denunciava as traições dos velhos partidos de esquerda aos princípios do marxismo e às teorias revisionistas de Eduard Bernstein.Com o isolamento da revolução, sob forte ataque do imperialismo, e a teoria estalinista do “socialismo em um só país”, a Internacional Comunista, como também ficou conhecida, passou a ser apenas uma correia de transmissão da burocracia que crescia na Rússia. Mesmo assim, era causa de grandes temores nos países capitalistas onde, em muitos deles, a burguesia optou por governos autoritários. A crise capitalista nos anos de 1930 e a disseminação do fascismo levou à Segunda Guerra Mundial, a forma já tradicional dos capitalistas de destruir forças produtivas para recuperar suas taxas de lucro.O aparato é o mestre do partidoNa virada dos anos de 1920, começou-se a usar a expressão “estalinismo” para o que acontecia na União Soviética, mas Josef Stálin não era uma personalidade conhecida, não figurava entre os grandes oradores, não tinha escrito nada e nem participava de debates. Ele “cresceu nas sombras do aparato” e “de repente” apareceu como o “grande líder” do Partido Comunista, para o qual as divergências internas eram sinais de fraqueza, quando não de alta traição às causas da revolução. Ele põe fim à democracia interna, ao centralismo democrático, e cria sua “nomenclatura”, ou seja, demonstra sua força pela capacidade de nomear a todos segundo os propósitos da casta dirigente. O Comitê Central se reúne apenas para as formalidades; mas o poder fica nas mãos de um diminuto grupo de chefes, que tinham amplos poderes perante seus coordenados (que se punham como medíocres diante do chefe maior). Os serviços de segurança, os cargos no partido, a polícia política etc., todos eram nomeados e não existiam mais eleições de fato, quando aconteciam, eram meras formalidades. O centralismo democrático foi sequestrado pelo burocratismo.Dentro da miríade de quadros políticos que existiam na Rússia, Stálin era completamente inapto para dirigir uma internacional. Sua militância somente interna à Rússia e sem conhecimento de qualquer língua estrangeira são alguns dos elementos que lhe restringia o campo de atuação e só começou a ditar regras depois de ter dominado completamente o PCUS (Partido Comunista da União Soviética). Dentro do aparato, o “leninismo” se tornou o oposto de “trotskismo” e os comportamentos “desviantes” dos “inimigos internos” deveriam ser depurados. As críticas só podiam ser feitas em relação aos militantes de base, que eram obrigados a fazerem a “autocrítica” e depois eram expurgados. Os critérios de crítica usados pelos bolcheviques antes, durante e logo depois da tomada do poder foram abandonados. O modelo piramidal tomou conta do partido, do Estado e da sociedade. Nesse protótipo, os Sovietes (Conselhos) foram suprimidos. Essas concepções foram transferidas para a Internacional Comunista, mas não foram obras de um homem. Elas foram consequência das condições de isolamento, da contrarrevolução e da miséria que criaram as condições para que o stalinismo se tornasse uma realidade. Como escreveu Marx: “os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem como sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”. A burocratização se dá sob as bases materiaisO sonho dos abnegados militantes dos partidos comunistas em todo o mundo foi descrita por um militante norte americano, Bem Gitlow, da seguinte forma: “A maior ambição de um membro do partido era servir a causa e se tornar um revolucionário profissional – responsável e organizador assalariado (“permanente”) ... As ordens dadas eram executadas”. No livro “História da Internacional Comunista”, o comunista e historiador francês Pierre Broué, citando outro membro do Partido Comunista, insiste: “para ele [o burocrata], é de um conforto de boa classe média que beneficiam os dirigentes do partido, com este detalhe, entretanto, de que eles beneficiam de ‘ajudas’ para suas casas e para o trabalho político, sem contar com os motoristas/guarda-costas, frequentemente factótuns. O verdadeiro privilégio, contudo, eles descobrem por ocasião das viagens de férias na União Soviética, para ele ou para seus filhos. Isso sem falar que, no período da Grande Depressão, é um enorme privilégio ter um emprego permanente remunerado, sobretudo quando se tem fortes chances de ser inscrito nas listas negras do patronato. E, certamente, a estabilidade do emprego dos homens e das mulheres do aparato comunista está estritamente ligada à sua obediência e à sua docilidade para com a linha e suas guinadas”.O que valeu para o comportamento individual, neste caso, valeu também para toda a Internacional. Desde Moscou, o aparelho controlava os Partidos Comunistas do mundo inteiro, não só politicamente, mas financeiramente. Milhares de agentes do PCUS, agindo como militantes da Internacional, mantinham-se como espiões dentro das seções nacionais e exerciam forte pressão e controle para manter a política do “socialismo em um só país”. Isso explica, em grande medida, os reveses políticos dos partidos comunistas em todo o mudo.Os conhecidos Processos de Moscou, ocorridos entre 1936 e 1938, na URSS, liquidou com que restava da velha guarda do Partido Bolchevique. Todos os membros do Comitê central foram condenados à morte ou assassinados, exceto Stálin. O primeiro presidente da Internacional Comunista, Zinoviev, membro do Comitê Central desde 1907, foi condenado e executado em 1936, mesmo sendo o homem que indicou Stálin para ser Secretário Geral do PCUS, no seu XI Congresso, em 1922. Também Bukharin, a quem Lenin chamou de “filho querido do partido” em seu testamento, confessou, sob tortura, que planejou a eliminação de Stálin – foi condenado à morte e executado em março de 1938. Trotsky que era excelente orador, escritor e o principal organizador do Exército Vermelho, por precaução, foi condenado ao exílio, mas depois foi assassinado, em agosto de 1940, no México, por Ramón Mercader, espanhol e agente da NKVD, a agência de segurança e espionagem da burocracia soviética.A degeneração da IIIª Internacional se confunde com a do antigo Partido Bolchevique, mas permaneceu para a história como exemplo para todos os socialistas do mundo da grande construção feita nos quatro primeiros Congressos da organização, que trataram de questões como oportunismo e sectarismo, forma organizativa dos comunistas, intervenção nos sindicatos e nas eleições etc.Depois da morte de Lenin, os congressos da Internacional foram sempre formais e Stálin a dissolveu em maio de 1943, como parte de um acordo com os Aliados na Segunda Guerra Mundial. Essa política de alianças com o imperialismo foi coroada na Conferência de Yalta e Potsdam, em 1945.


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