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Tese Negros

Nota do Conselho Editorial do Jornal Gazeta Operária

Nos dias 19, 20 e 21 de abril, em Belo Horizonte/MG, aconteceu o III Congresso da Luta Pelo Socialismo (LPS). Além da delegação mineira, o Congresso contou com a presença de militantes e simpatizantes de vários locais do País como Paraíba, Pará, Rondônia, São Paulo, Brasília, entre outros. O objetivo da atividade foi debater o momento político pelo qual o Brasil e o mundo estão passando, além de definir a política de atuação do Coletivo para o próximo ano.

O norteador dos debates foram as Teses apresentadas, que buscaram caracterizar a conjuntura atual em cada setor, além de definir os eixos de atuação da LPS em cada segmento, seu posicionamento e suas bandeiras de luta.

Disponibilizamos, na íntegra, as Teses apresentadas e aprovadas no III Congresso da LPS. Contudo, é importante destacar que, dada a rápida evolução do momento político atual, é possível que alguns fatos apresentados nos documentos estejam defasados, o que não retira a importância dos mesmos.

A todos, boa leitura e bom debate.

 


Negros e escravidão


1. A questão negra sempre é de extrema relevância para a luta contra os abusos do sistema capitalista. Afinal, quem sempre esteve na ponta oposta do capitalismo global? Os mesmos que foram escravizados e marginalizados: o povo negro.

2. Em África, o povo negro se concentra na região da África subsaariana. Essa região foi, e ainda é, extremamente penalizada pelo sistema capitalista global, ao que se estende desde as grandes navegações. O capitalismo transformou a prática da escravidão em uma enorme lógica de mercado, retirando a força produtiva africana, seus saberes sobre cultivo e mineração e transplantando-os aos seus serviços nas colônias americanas.

3. Além disso, foi a região que mais sofreu com os absurdos da colonização ao longo dos séculos XIX e XX e com as guerras civis após as independências. No sistema colonial que a Europa impôs à África, por muitas vezes uniu etnias que historicamente eram rivais em um território que posteriormente se tornou independente e unificado, gerando inúmeras guerras civis. Mesmo após as independências, os grandes capitalistas trataram de entrar no continente, sobretudo a partir do “auxílio” neoliberal aos países africanos, após a Guerra Fria. Seguindo a lógica de exploração a partir da exportação de capital financeiro, o capitalismo manteve sob seus ditames econômicos, e, portanto, políticos, as nações recém-independentes em África, gerando fomes, epidemias, etc.

4. Entender este momento, logo em seguida à colonização, é essencial para a explicação dos problemas africanos na virada do século XX para o XXI. Ainda hoje, os dez países mais pobres do mundo estão na África.


O negro no Brasil


5. A história negra no Brasil se inicia com os horrores da escravidão. As fontes oficiais estimam que mais de 4.864.374 escravizados africanos vieram para o Brasil, tornando nosso País o maior receptáculo do mundo.

6. A abolição da escravidão, em 1888, que ocorreu por uma série de lutas de resistência do povo negro, além das pressões internacionais dos grandes imperialistas da época, não trouxe medidas que levassem à inserção do negro na sociedade brasileira. De fato, o negro permanece marginalizado na sociedade, ficando com os piores postos de trabalho, subjugado à condições precárias de estudo e moradia e habitando os locais com menos infraestrutura.

7. Os dados são evidentes neste sentido: os negros são 54% da população do País e apenas 17% estão entre os mais ricos. Além disso, de acordo com o relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre minorias, 70,8% dos 16,2 milhões de brasileiros vivendo na situação de extrema pobreza são negros. Em pesquisa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudo Sócio-Econômico (DIEESE), direcionada ao emprego e desemprego, as conclusões são que ainda existem desigualdades no acesso ao mercado de trabalho e nas condições de trabalho que afetam os negros. Conforme os dados recolhidos, os negros têm menores condições de acesso e permanência no mercado de trabalho, sendo os mais atingidos em situação de desemprego. A dimensão da desigualdade entre negros e não negros nos mercados de trabalho fica evidente quando se analisam os rendimentos médios reais por hora trabalhada, sendo que os não negros recebem, em média, quatro reais a mais. Além disso, as estatísticas demonstram que existe um verdadeiro genocídio do povo negro. De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), no último ano foram assassinados 62.517 jovens com idade entre 15 e 29 anos. Desses, 77% são negros. Temos ainda que 75% da população carcerária do Brasil é composta por negros. Esta disparidade é reflexo da opressão e marginalização sofrida por essa importante parcela da população trabalhadora e está diretamente relacionada à discriminação policial. Quando os acusados são negros, a propensão é para condenações de privação da liberdade, em lugar de penas alternativas. A abordagem policial, aliás, é mais um dos fatores ligados ao genocídio do povo negro, uma vez que mortes de afrodescendentes ligadas às ações policiais são três vezes mais numerosas do que as registradas contra brancos.

8. O governo golpista de Michel Temer extinguiu, no ano de 2016, o Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Assim, a previsão é que a situação deva se agravar. O governo fascista de Jair Bolsonaro já afirmou a não demarcação de novas terras quilombolas, além dos ataques verbais proferidos contra essas comunidades. Não obstante, vivemos uma das maiores crises da história do capitalismo, e os ataques serão intensificados e direcionados àqueles que já são estruturalmente excluídos. Afinal, é justamente a exploração do homem pelo homem a base existencial deste sistema de opressão. Ataques à classe trabalhadora de conjunto e àqueles que já vivem em pior situação estão se ampliando com as reformas Trabalhista e da Previdência, afetando ainda mais as condições de vida da população negra e pobre.

9. Essa previsão de uma piora no governo Bolsonaro se concretiza a partir do exemplo da extinção do Centro de Estudos Africanos da Universidade Federal de Minas Gerais. O Centro, que na última década foi responsável pela expansão dos estudos sobre África e suas ligações com o Brasil, não existe mais organicamente e a área ficará sem receber recursos.
Bases da LPS para a formação de um movimento negro

10. A história do movimento negro vem desde a luta dos escravos, que fugiam das senzalas e se organizavam em quilombos, faziam a luta armada contra vilarejos e viajantes, compravam a liberdade de seus pares através das cartas de alforria, dentre outras formas de protesto. Através da luta, os negros conseguiram pressionar a aprovação de várias leis que culminaram na abolição da escravidão promulgada pela Lei Áurea, de 1888. Porém, os negros passaram a lutar contra outras formas de repressão e controle capitalistas: o preconceito e a desigualdade social.

11. Não houveram políticas públicas voltadas à inclusão dos negros na sociedade. O que ocorreu, na realidade, foi a propagação de um racismo estrutural para todos os ramos da sociedade, que perdura até os dias atuais. Mesmo com o fortalecimento das lutas à nível global ao longo dos anos, a formação de grupos como os Panteras Negras, que serviram e ainda servem de inspiração à luta negra, e a atuação de grandes nomes, como Rosa Parks e Abdias Nascimento, as pautas do movimento negro ainda estão longe de serem alcançadas e a luta se faz mais que necessária.

12. A LPS busca a fomentação de um movimento negro que fortaleça as pautas do movimento, reafirmando a importância da construção da sua identidade, valorização de suas raízes e sua resistência histórica, mas lembrando que o que move a base da lógica racista é a mesma que move a base do capitalismo, a opressão do homem pelo homem, e que sem a tomada do poder pela classe trabalhadora em todas as instâncias da macroestrutura, o “empoderamento” se torna impossível. A base teórica marxista-leninista-trotskista nos ensina que a luta, assim como a revolução, deve ser permanente e não um fim em si mesma. A revolução não irá acabar com o racismo imediatamente, mas sem definhar a base material da opressão e sem a consciência de classe não será possível acabar com a opressão, sobretudo baseado em características raciais ou de gênero.


Propostas de atuação política da LPS para a questão negra


13. Ampliação da atuação do movimento negro da LPS, através de seu Coletivo de Negros, tendo como norte que essa luta é parte intrínseca à luta proletária geral contra o capitalismo;

14. Realização de plenárias mensais que tenham como tema a opressão ao povo negro e tirar encaminhamentos para organizar a luta;

15. Combate político e social irrestrito ao racismo, em suas mais variadas formas e instâncias;

16. Estruturar a Secretária de Negros para organizar um plano de lutas e atividades voltadas à questão de raça;

17. Lutar em favor das bandeiras democráticas do povo negro, como política de cotas e demarcação de terras quilombolas;

18. Denunciar constantemente o genocídio do povo negro;

19. Engajar a militância negra na redação de materiais para a internet, jornal Gazeta Operária, jornais sindicais e movimento social;

20. Criação de uma revista voltada para as pautas negras atuais;

21. Fortalecimento das manifestações afro-brasileiras dentro da nossa instituição;

22.  Promover o conhecimento de história e análise social e política da situação negra no continente africano e no Brasil.


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