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Destruição da educação superior pública brasileira

No dia 16 de julho, em reunião com reitores de universidades públicas brasileiras no prédio do Ministério da Educação em Brasília, tornaram-se conhecidos os reais planos do governo Jair Bolsonaro para a educação superior pública brasileira. Trata-se do projeto “Future-se”. Segundo o Ministério da Educação, é um projeto baseado no seguinte tripé: pesquisa e inovação; internacionalização; e gestão. Por trás da verborragia liberal do projeto, está explícita a real iniciativa: retirar do Estado a função essencial e historicamente conquistada pela classe trabalhadora de fornecer educação pública e transformar as universidades federais em parcerias público-privadas (PPP).

Não precisa procurar muito para entender essa perspectiva liberal e privatista do projeto. O ponto de pesquisa e inovação é embasado na lógica de consolidação da interação entre Universidade-Empresa. Além da óbvia ingerência que empresas privadas terão na pesquisa, se pegamos outro ponto, que é a busca e premiação por obtenção de patentes, percebemos que o governo federal está entregando o pessoal qualificado e todo a infraestrutura criada pelo Estado, com dinheiro da população, para as empresas privadas buscarem melhorias em sua produção. Pouco ou nada ficará para o Estado.

Além disso, a proposta coloca em cheque quais áreas receberão investimento, à medida que o investimento em pesquisa for se tornando PPP. Não é de interesse do capital privado investir em áreas que não darão retorno em lucro material imediato. Assim, áreas que têm retorno social, como as ciências humanas que permitam a elevação do senso-crítico serão deixadas de lado. Áreas que visam reparar problemas sociais, como por exemplo a Educação no Campo, serão simplesmente abandonadas.

No campo da internacionalização, o projeto é ainda mais claro. Na parte “Idiomas” do projeto, afirmam-se “parcerias com instituições privadas para promover publicações no exterior, substituindo o Idioma sem Fronteiras”. O ISF, e seus desdobramentos como os idiomas para fim acadêmico, é uma importante ferramenta pública e gratuita de internacionalização, atendendo um grande número de alunos de graduação, pós-graduação, técnicos administrativos e professores que desejam aprender línguas estrangeiras para internacionalizar suas pesquisas. As empresas privadas, cientes desse campo em aberto, farão a festa agora cobrando por um programa que anteriormente era gratuito.

O outro ponto do tripé, gestão, tem como palavra-chave o infame “empreendedorismo”, forma com que os liberais tentam convencer os trabalhadores de que, se estão desempregados, basta se tornarem empreendedores individuais que conseguirão sobreviver. Em um mundo governado por monopólios, trustes, cartéis e holdings, a livre concorrência entre esses “empreendedores” e as grandes corporações é uma falácia. Para resolver esse problema, os mesmos liberais propõem a, não menos infame, meritocracia, em que se você se esforçar muito, mesmo possuindo apenas uma barraquinha de sorvete, conseguirá competir em igualdade com, por exemplo, o Mc Donald’s.
 
Como se vê, bem a verdade, o projeto “Future-se” não é nada mais nada menos do que o fim das Instituições de Ensino e Pesquisa Federais. Se aprovado, o projeto transformará as universidades em mais uma área de expansão dos tentáculos do capital financeiro, sem nenhum interesse e necessidade de dar algum grau de retorno à sociedade.

 

Tudo dentro do esperado

 

Ninguém minimamente coerente pode se dizer surpreso com a atitude do Ministério da Educação, capitaneado por Abraham Weintraub. O atual ministro é um homem do mercado financeiro, com mais de 20 anos de atuação. Ao propor a privatização do ensino e pesquisa de nível superior no Brasil, ele não faz nada além do que legislar em causa própria. Foi ele o homem responsável por anunciar o corte de 30% em recursos destinados as universidade federais, dando seguimento à prática de precarizar para privatizar.  

O efeito prático deste contingenciamento, somado à Emenda Constitucional 95 que limitou o teto dos gastos com Educação por 20 anos, está sendo avassalador. Hoje, segundo o Censo da Educação Superior do INEP, o Brasil possui 296 Instituições de Educação Superior Públicas (IES). Três quintos dessas IES federais são universidades e 36,8% são Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFs) e Centros Federais de Educação Tecnológica (Cefets). O presidente da Academia Brasileira de Ciências, Luiz Davidovich, físico e professor da UFRJ, apresentou pesquisa no site da própria organização em que mostra que 95% da ciência produzida no Brasil provém justamente as IES Públicas. O que Weintraub está fazendo é simplesmente entregar   toda a infraestrutura da produção de pesquisa, inclusive o pessoal qualificado, ao capital privado.

O próximo passo, fatalmente, será permitir cobranças de mensalidades na pós-graduação e na graduação das universidades federais. Isso, inclusive, pode ser uma das formas propostas para captação de recursos proposto pelo “Future-se”. Os proponentes do projeto têm como espelho atingir a forma em que funcionam parte das universidades nos Estados Unidos, em que é quase uma unanimidade a cobrança de mensalidades.

Para pagar seus estudos, as famílias e os jovens estadunidenses fazem empréstimos bancários que, ao fim, se tornam impagáveis. Em dados atualizados no dia 18 de julho, dentre a monstruosa dívida pública de US$ 22,5 trilhões dos Estados Unidos, US$ 1,620 trilhão é referente apenas a dívida estudantil. Ou seja, o trabalhador qualificado se forma na universidade já com uma dívida absurda e que, por vezes, demorará toda a vida (ou mais) para ser paga. É este o modelo, já falido nos Estados Unidos, que está sendo importado para o Brasil.

 

Defender a educação superior pública é defender a classe trabalhadora

 

A educação pública, gratuita e de qualidade oferecida pelas universidades federais brasileiras é uma conquista histórica de sua classe trabalhadora. A luta que deve ser movida agora é para barrar sua privatização e evitar a transformação da educação em mercadoria. A luta deve ser direcionada para uma abertura ainda maior da universidade pública aos filhos da classe trabalhadora, propondo, por exemplo o fim do vestibular e o ensino universal.

A juventude que estuda e trabalha, junto à classe trabalhadora, demonstrou nas manifestações de 15 e 30 de maio e 14 de junho, que não está disposta a entregar de bandeja a educação pública. Milhões de pessoas estiveram nas ruas de todo o país, demonstrando o seu descontentamento com o corte de gastos impostos por Weintraub e sua trupe.

Ainda no dia 16, um grande número de estudantes reunidos em Brasília por ocasião do Congresso da União Nacional dos Estudantes (Conune), se reuniram para protestar contra o “Future-se”, na frente do prédio onde ocorria a reunião com os reitores. Foram covardemente reprimidos pela polícia. Em lugar de se encolher, a UNE está convocando um novo Tsunami da Educação para o dia 13 de agosto. A juventude mostra o caminho da luta. É estritamente necessário nos mobilizarmos nas ruas para defendermos nossos direitos, como o direito à educação pública.


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