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Socialismo e Anarquismo no início do século

Edgar Carone nasceu em São Paulo, em 14 de setembro de 1923. Filho de um imigrante libanês, formou-se historiador e se tornou um dos principais intelectuais marxistas brasileiros. Trabalhou na Fundação Getúlio Vargas e na Universidade de São Paulo, onde se tornou professor titular do curso de História do Brasil. Publicou 27 obras, em 30 anos de atividade profissional. O livro “Socialismo e Anarquismo no Início do Século” faz parte desse acervo.

O livro em análise é composto por vários ensaios sobre o movimento operário europeu entre 1870 e 1914, período de fundamentação e de efervescência de atuação prática socialista e anarquista na Europa. É o caso, por exemplo, da primeira união sindical, o primeiro congresso operário, a primeira candidatura trabalhista, o processo de burocratização dos partidos operários da Europa Ocidental, que com o tempo se tornaram reformistas.   Em sua análise, Carone dividiu o livro em duas partes, uma dedicada a analisar o socialismo, e outra o anarquismo.

 

Socialismo

 

O primeiro capítulo é dedicado a escrever sobre a formação dos Partidos Operários na Europa. Neste tópico, o autor demonstra que “a gênese do processo está ligada a dois polos interdependentes, que são os sindicatos e os partidos”. Os momentos chave desta criação foram a existência da I Internacional (1864/1872) e da realização da Comuna de Paris (1871). Constituíram-se como instrumento de luta e demonstração, na prática, de necessidades organizativas.

A partir disso, segue a intepretação da formação do Partido Social Democrata Alemão, em 1875, no Congresso de Gotha. Ele surgiu da fusão entre seguidores de Ferdinand Lassale, que afirmava que o proletariado deveria ser amparado pelo Estado que deveria ser conquistado pelo voto dos trabalhadores, e marxistas que acreditavam na necessidade da revolução social. Seus primeiros líderes foram Liebknecht e Bebel. No fim do século XIX, o partido está sob liderança de Kautsky e Bernstein e experimenta uma enorme ascensão, chegando a ter mais de um milhão de filiados em 1914. Cresce também o número de deputados eleitos, chegando a 110 deputados, em 1912. Carone associa este último crescimento como indicativo da simpatia dos socialistas alemães pelo parlamentarismo e ações legais, e a ideia de passagem do capitalismo para o socialismo por ações legais.

Após uma análise sobre a conformação do Partido Operário Belga, o autor passa debater a formação do Partido Socialista Frances. Este é composto pela fusão de diferentes correntes: o Partido Operário, cujo programa foi redigido por Marx e Engels; o Partido Blanquista; a Federação dos Trabalhadores; o Partido Operário Social Revolucionário e, por fim, os Independentes, que se manifestaram individualmente até 1898 e criaram, com o tempo, a Federação dos Socialistas Independentes e a Federação dos Socialistas Revolucionários independentes. Sob críticas da II Internacional, que afirmava que esta fragmentação era negativa, se fundem no Partido Socialista Frances, em 1905.

No segundo capítulo, nomeado “Mais uma vez a II Internacional”, Carone faz o debate sobre como, no Brasil, sob forte influência cultural francesa, a literatura socialista que circulava no início do século era majoritariamente produzida na França. Argumenta que mesmo na França havia pouco trânsito da teoria socialista alemã. O autor afirma que a literatura alemã seria mais ideológica, enquanto a francesa seria mais tática. A partir disso, parte para uma análise da literatura socialista alemã, que cobre assuntos que vão desde a infância até a poesia operária.

No terceiro capítulo, “O que é ser reformista? O que é ser revolucionário?”, Carone se dedica a responder estas duas questões. Argumenta que, no campo socialista, o antagonismo entre reformistas e revolucionários só vai se acentuar depois da Revolução Russa de 1917. Nas palavras do autor “entre 1870 e 1914, domina, em parte, a incerteza ideológica e a imprecisão partidária. Neste contexto, os termos revolucionário e reformista ainda não tomam seu sentido atual, porque, no momento inicial do processo de formação partidária moderno e da formulação de sua justificativa, o fato de ser verdadeiramente um ou outro não obriga nenhum deles a se renegar. Ser reformista e ser revolucionário ainda não é questão fundamental. É a guerra e a Revolução de 1917 que vai obrigar o proletariado e suas agremiações a se definirem e escolherem seu campo de luta. Nessa hora, a aparente neutralidade já deixa de existir, a tomada de posição é inevitável”.

No quarto e no quinto capítulo, “Abaixo a guerra! Viva a guerra!” e “Le drôlle de guerre ou união sagrada”, Carone analisa este que ele considera um divisor de águas entre reforma e revolução: o papel da guerra. Segundo o autor, é a tomada de decisão a favor do Estado, logo, a favor da guerra, que vai definir ideologicamente o reformismo, enquanto a rejeição ao conflito aprimorou ideologicamente os revolucionários.

 

Anarquismo

 

A segunda parte do livro é dedicada a análise do anarquismo. No primeiro capítulo, “Anarquismo e Literatura: Jean Grave e Temps Nouveaux”, Carone explicita seis correntes anarquistas: a primeira, a individualista, o papel principal é de Max Stirner, datada de meados de 1840, que define o indivíduo como única realidade e único valor possível. A segunda, mutualista, existente de 1840 a 1850 e tem Proudhon como maior representante. Prega a revolução como necessária, mas não violenta. A terceira seria o coletivismo autoritário, defensora do ateísmo, abolição de classes, igualdade econômica, política e social entre ambos os sexos. Terra e instrumento de produção propriedade coletiva, a quarta delas, denominada comunista libertária, defende a ideia que o processo histórico é pacífico e inevitável e que a mudança é impulsionada pelo desenvolvimento da sociedade, principalmente das forças produtivas, e pelo progresso da educação. A quinta corrente é a da violência. Se limita ao ataque a indivíduos da classe dominante. Por fim, temos a sexta corrente, o anarco-sindicalismo.

O segundo capítulo é dedicado apenas a analisar o anarco-sindicalismo, corrente que aparece com o florescimento dos sindicatos no fim do século. Carone considera que seu surgimento vem da fraqueza organizacional das correntes anteriores. Tem como eixos fundamentais a defesa da ação direta, que “significa que os explorados, isto é, o proletariado, tem que enfrentar, por si só, o sistema dominante, a burguesia. Nada de auxílio do Estado, e sim contra o Estado; nada de ação parlamentar, e sim contra o Congresso; nada de partido, e sim contra partido”. A Greve Geral seria a principal forma de materialização da Ação Direta.

No terceiro e último capítulo do livro, “Propaganda pelo fato”, Carone analisa a quinta corrente, propositora do terrorismo individual. Isso nada mais é do que o indivíduo atacar fisicamente figuras de autoridade ou burgueses, atuando como “exemplo” para as massas. Seu resultado é pífio, servindo apenas para aumentar a repressão do Estado.

O tipo de análise feita por Carone é essencial para os marxistas. Pelo método histórico-dialético, devemos apreender as lutas feitas no passado para evitarmos seus eventuais erros e aproveitarmos seus acertos. É pelo acúmulo histórico da experiência do proletariado que devemos fazer nossa ação teórica e aprimoramos nossa prática.


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