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As armadilhas do Novo Fundeb

No último dia 21, em votação quase unânime, foi aprovado na Câmara dos Deputados o novo Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e da Valorização dos Profissionais da Educação), a matéria segue para o Senado. A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 15/2015, da Deputada Dorinha (DEM-TO), que torna o Fundo permanente foi motivo de muitos debates nas últimas semanas.

Desde que foi criado, em 2006, o Fundeb é a principal fonte de financiamento da educação básica e tem como objetivo diminuir as disparidades da qualidade da educação pelo país. Seus recursos são distribuídos de forma que o investimento por aluno em cada município ou estado nunca seja inferior a um valor mínimo fixado para cada ano. O fundo é usado para pagamentos dos profissionais da educação, dentre eles os professores e funcionários de escolas e manutenção da educação, a exemplo de compra de equipamentos, concessão de bolsas e aquisição de material didático. O Fundeb ganhou importância histórica por ter ajudado a universalizar a educação no país.

As organizações de luta dos trabalhadores em educação do País, denunciaram, acertadamente, a intenção do governo Bolsonaro de desconfigurar o projeto, porém é preciso considerar armadilhas privatistas contidas na PEC 15/2015, aprovada por um congresso inimigo dos trabalhadores. Os trabalhadores da educação não podem alimentar ilusões das boas intenções de um congresso privatista e que tem negociado pautas que acarretam a perda de direitos da classe trabalhadora. 

 

Bolsonaro tentou piorar o projeto da direita

 

Desde que a emenda da Deputada Dorinha passou a ser debatida no mês de julho, o governo federal fez forte pressão para inserir no texto as propostas ultraliberais do ministro da economia, Paulo Guedes. 

Entre as mudanças desejadas pelo governo Bolsonaro estava o estabelecimento de um teto de 70% para os recursos do Fundo que poderiam ser utilizados para o pagamento de salários, sendo que a maioria dos municípios nacionais e alguns estados utilizam mais de 80% dos recursos do FUNDEB para este fim. Além disso, Paulo Guedes queria utilizar a metade do aumento da complementação da União para financiar programa de renda mínima à população, como forma de substituir o programa Bolsa Família. O governo também sinalizou seu objetivo de investir na privatização da educação, admitindo o pagamento de vouchers (bolsas) para escolas particulares com recursos do FUNDEB. 

Os destaques do governo foram derrotados na votação do Fundeb permanente e as organizações classistas que representam os trabalhadores em educação consideraram o fato como uma vitória da luta pela Educação Pública, uma vez que o fundo tem sido fundamental para a valorização e o investimento nos estudantes e trabalhadores da educação pública. 

 

As armadilhas do projeto do DEM e o lobby privatista  

 

Das cinco emendas ao texto original aprovadas, quatro foram apresentadas por deputados formados pela Fundação Lemann (Tiago Mitraud, Tabata Amaral e Felipe Rigoni), eleitos com campanhas financiadas pelo empresariado. Para se ter uma ideia, Tiago Mitraud, um ultraliberal que defende a extinção do Estado, teve como financiador de sua campanha, entre outros, José Salim Mattar Junior, dono da Localiza e atual Secretário de Desestatização do governo federal.

Nas emendas apresentadas pela Bancada da Fundação Lemann, está presente a defesa de mais recursos para a educação desde que a distribuição desses recursos esteja baseada em indicadores meritocráticos, característicos da reforma empresarial da educação, e nos repasses para a iniciativa privada. A destinação de recursos para escolas com fins lucrativos foi rejeitada, mas permitiu-se que instituições privadas confessionais e comunitárias, que alegam não ter fins lucrativos, mas têm, possam ser beneficiadas.

Não à toa, a aprovação do novo Fundeb foi festejada em editorial do jornal Estadão, porta voz dos interesses burgueses no país. O jornal comemora o fato de o projeto atrelar os recursos do Fundo ao cumprimento de metas de qualidade. Pela PEC 15, a avaliação das metas a serem cumpridas pelos municípios para receber a parcela de recursos procedentes do ICMS terá por base indicadores de melhoria nos resultados de aprendizagem e de aumento da equidade, considerado o nível socioeconômico. O objetivo é criar mecanismos de controle do trabalho docente e uma padronização a ser cobrada da escola, instalando o “gerencialismo” nas práticas pedagógicas. A avaliação externa é o instrumento mais contundente para controle sobre o currículo e sobre o a formação dos professores. 

Onde são aplicadas, como no Estado de São Paulo, as avaliações externas servem para culpabilizar professores e gestores pelos problemas de aprendizagem decorrentes da desigualdade social, sem que se criem mecanismos para combater essa desigualdade. Enquanto constroem índices educacionais, os governos promovem a precarização do trabalho docente, o fechamento de turmas e a superlotação de salas de aula. O profissional da educação básica fica refém de críticas que abrem o caminho, frente à opinião pública, para o aumento da presença de instituições privadas no setor. Porém, distantes dos interesses reais da população, o objetivo dos setores privados é a produção de um estreitamento curricular, fazendo com que os alunos se esforcem apenas para um bom resultado nas provas externas padronizadas. 

 

Ataques à valorização salarial dos professores

 

Com a aprovação do Novo Fundeb e o aumento de 10% para 23% da participação do Governo Federal nos investimentos na educação, criou-se uma expectativa positiva em relação à valorização do piso salarial dos professores pois a Lei do Piso Salarial Nacional do Magistério estabelece que o reajuste dos salários dos docentes acompanhe os cálculos do custo aluno/qualidade que orienta a distribuição dos recursos do Fundeb. 

O governo, com apoio do Partido Novo, tentou acabar com essa regra através de um destaque no dia 21, mas foi derrotado. Porém, em uma manobra perspicaz, o tema voltou à pauta na Câmara dos Deputados através de um projeto, engavetado há 12 anos. O Projeto de Lei (PL) 3776/2008 institui o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) como índice de reajuste do Piso Nacional do Magistério. O Congresso retomou a discussão desse PL, que tramita agora em regime de urgência. Se aprovado, a mudança poderá condenar ao congelamento os salários dos professores em boa parte dos estados e municípios. Na prática, a maioria dos estados e municípios não cumprem as determinações da Lei do Piso Salarial Nacional do Magistério, mas ela serve como mecanismo de pressão para as lutas da categoria. 

Os trabalhadores não terão vitórias a comemorar enquanto não conseguirem unificar a luta contra o conjunto da política desse governo, que declara que os servidores públicos são inimigos a serem abatidos com uma granada. As comemorações das forças progressistas e de esquerda sobre a aprovação da proposta privatista do DEM, cumpriu a tarefa de criar falsa expectativa em relação à possibilidade de o Congresso Nacional derrotar o governo Bolsonaro em favor dos trabalhadores. Não foi o que aconteceu dia 21. Pelo contrário, foi uma vitória do lobby empresarial na educação, ainda que em menor grau do que o governo pretendia. A aprovação do PL 3776 representará a vitória de prefeitos e governadores que pressionam pelo fim dos reajustes do piso salarial dos professores de acordo com os repasses do Fundeb.

À classe trabalhadora só resta a mobilização em defesa da Educação Pública, gratuita e de qualidade para todos. As verbas públicas devem ser exclusivas para a melhoria das escolas públicas, não para enriquecer corporações bilionárias.
 


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