Na última sexta-feira, os deputados federais Rogério Correia (PT) e Odair Cunha (PT) e os deputados estaduais petistas de Minas Gerais, André Quintão, Beatriz Cerqueira e Ulysses Gomes foram ao Acampamento Quilombo Campo, em Campo do Meio (MG), para somar força na resistência, acompanhar e fiscalizar a ação truculenta de reintegração de posse contra as famílias trabalhadoras do Acampamento.
Abaixo segue o relato da deputada Beatriz Cerqueira, divulgado em suas redes sociais, onde também relatou as diversas articulações feitas anteriormente para “suspender esta crueldade: no judiciário, Defensoria Pública, Ministério Público, denúncias a Organizações internacionais e tentamos diálogo com o Governo, que se recusou, apesar das nossas insistentes tentativas”.
Quem esperava um povo resignado depois de 3 dias ininterruptos de resistências se decepcionou. Encontramos um povo machucado na alma pela violência sofrida, mas consciente do seu papel e saímos de lá com a certeza de que o derrotado foi quem fez da covardia sua política, o governo Zema. Este é o meu relato da ida ao Acampamento Quilombo Campo Grande nesta sexta-feira, dia 14 de agosto de 2.020.
Fomos impedidos pelo Comando Militar da operação na área de entrar pela via pública de acesso para nos encontrarmos com as pessoas. Questionado, afirmou que a operação de reintegração de posse não tinha terminado e que ele tinha protocolos a seguir. Informei que, como deputada estadual, tinha a prerrogativa de entrar, que os protocolos da Polícia Militar não são superiores a Constituição do Estado. Obtive como resposta de um Major voz de prisão se insistisse. Depois da ameaça do Comandante, dois sargentos começaram a filmar. Depois da ameaça. Para este Comandante, suas ações são absolutas e não passíveis de fiscalização ou acompanhamento. Demonstra o caráter autoritário presente na operação. Então, podem imaginar o que as pessoas passaram nos últimos dias. Tivemos acesso as pessoas passando por uma área queimada e pulando uma cerca. A obstrução da região feita pelo batalhão de choque não era na área de reintegração e tinha por objetivo isolar as pessoas.
Após analisar toda a operação montada, não resta dúvidas: Zema aparelhou o governo, gastou dinheiro público para fazer uma disputa ideológica e política, além de autorizar a prática de violência contra a população. Nada teve a ver com cumprimento de decisão judicial. Foram cerca de 250 policiais, dezenas de viaturas, caveirão, helicóptero, bombas de gás lacrimogêneo, Batalhão de Choque, caminhão do Corpo de Bompeiros, três dias operações fora o tempo de deslocamento, diárias, hospedagens, alimentação. Tudo pago com dinheiro público para retirarem e destruirem a casa de 6 famílias, além da escola. O plano do governo era maior.
A resistência feita pelos agricultores e agricultoras nestes três dias tinha razão de ser. Já tinham passado por experiência semelhante em 2009 quando, a pretexto de cumprir decisão judicial, o governo desapropriou uma área bem maior constituindo uma ilegalidade. Pessoas perderam animais, casas e plantações de uma hora para outra. Então, agora sabiam que o aparato montado tinha o mesmo objetivo: aproveitar uma decisão para ampliá-la ao máximo. Não conseguiram pela resistência que encontraram e pelos gritos que todos começaram a multiplicar denunciando a covardia que era praticada. O plano original do governo não foi cumprido.
Foi uma reintegração cheia de ilegalidades: além do Comandante que acha que seu poder é superior a Constituição do Estado, a prerrogativa dos advogados presentes não foi respeitada; não houve protocolo para retirada dos animais; crianças e idosos foram expostos a violência; não houve qualquer protocolo que protegesse as pessoas da contaminação da Covid-19; as pessoas não sabem para onde seus pertences foram levados nem foram informadas previamente para onde iriam.
Um padre foi detido quando se dirigia ao local. Foi impedido de falar com as pessoas.
Agentes públicos se recusaram e socorrer quem passou mal durante o ataque das bombas.
O judiciário local precisa ser investigado pelos órgãos competentes. Sua parcialidade é gritante. Como também foi absurda a manifestação de opiniões de policiais que ao abordarem assessores da Assembleia Legislativa disseram que deveriam “escolher um trabalho melhor”. O próprio Comandante ao externar sua posição de que iria me prender começou a dar opiniões sobre meu trabalho parlamentar!
A destruição da escola começou quando a Secretaria de Estado da Educação retirou o ensino regular do acampamento. Isso aconteceu no início de 2019. Para estudar, as crianças precisariam se deslocar longas distâncias. Mas isso não foi uma preocupação que incomodou o governo Zema. Criança fora ou dentro da escola, para ele tanto faz. Mesmo assim, a comunidade continuou com a escola, principalmente na tarefa de alfabetização de adultos. A sua destruição no dia 13 demostra o desprezo do governo com a educação. Foi simbólico. Os opressores destroem aquilo que é mais simbólico, que afeta a alma de uma comunidade. Foi o que fizeram.
Nesta sexta a noite participamos de uma Assembleia com todos que estavam na resistência. Nos comprometemos em ajudar na reconstrução da escola e de tudo o que foi destruído, no empoderamento das mulheres com a geração de renda através dos projetos com ervas e raizes que é desenvolvido no Acampamento; tudo o que foi destruído, vamos reconstruir. Mais forte e mais bonito. Também nos comprometemos em denunciar as violações de direitos humanos praticadas e seguir com as medidas que já iniciamos tanto na Câmara dos Deputados como na Assembleia Legislativa; acompanhar até que tenham a liberdade garantida as 4 pessoas que foram detidas. Ao final da Assembleia o balanço foi de vitória de todos que resistiram ao conseguirmos que as operações encerrassem. Ainda mais sabendo que o plano original não foi alcançado, que era expulsar muitas famílias de suas terras, mesmo sem decisão judicial que amparasse tal medida. Viva o povo que resistiu m! Viva o Quilombo Campo Grande! Viva o MST!