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O Chile contra a herança de Pinochet

No dia 25 de outubro de 2020, os chilenos protagonizaram um evento histórico e declararam resolutamente sua oposição às heranças do período Pinochet por meio do plebiscito no qual decidiram por uma nova constituição. Com mais de 75% dos votos, os chilenos optaram também que essa nova constituição deverá ser elaborada por uma Assembleia Constituinte, eleita especificamente para isso.

No Chile vigora a constituição de viés neoliberal, e uma das mais abertamente antipopulares do continente, elaborada em 1980 pela ditadura militar do General Pinochet, que durou de 1973 a 1988. Tendo sido imposta à força, Pinochet e seus apoiadores estadunidenses puderam aplicar, por meio dela, as medidas mais terríveis em favor do mercado financeiro e contra os trabalhadores, como a privatização dos serviços e bens essenciais e a impunidade para crimes dos militares que massacraram milhares de ativistas, simpatizantes de esquerda e oposicionistas ao governo. A ditadura Pinochet foi uma das mais brutais do século passado e suas cicatrizes continuam ainda em carne viva.

Quando finalmente, em 1990, foi restaurada a democracia liberal no Chile, optou-se por manter a constituição da ditadura, uma garantia para a burguesia que nada mudaria demais, mesmo com Pinochet finalmente fora do poder. Até hoje o legado neoliberal da ditadura oprime os chilenos, que ano passado se levantaram e colocaram fogo nas ruas, exigindo mudanças – sobretudo da constituição.

A nova constituição é, no entanto, uma vitória parcial do povo chileno, que ao tentar se soltar dos grilhões malditos da ditadura, não conseguiu superar a paralisia das lideranças de esquerda que se retraíram durante os protestos, permitindo que a revolta popular ficasse sob controle dos interesses da burguesia. Ela foi, talvez, a única saída para que o governo Piñera, pivô dos protestos populares, se mantivesse no poder e a democracia liberal não se desintegrasse por completo. Ela pode ser, sim, uma oportunidade para dar um contragolpe na burguesia e conquistar direitos como educação e saúde universal e gratuita – conquistas urgentes no momento de crise planetária da pandemia – desde que a pressão popular se mantenha forte sobre o processo de sua construção.  Afinal, é certo que, frente ao grande capital, constituições, assim como toda atividade parlamentar, são elaboradas sob forte influência do poder econômico e, mesmo quando contém avanços sociais, não garantem sua devida aplicação.   

A eleição dos delegados da Comissão Constitucional, composta por 155 representantes, se dará em 11 de abril de 2021, juntamente com as eleições parlamentares e presidenciais. O número reduzido de delegados constituintes e as regras eleitorais do período da ditadura, ainda vigentes, podem ser indícios de que a direita terá condições de controlar facilmente o processo. Os chilenos deram o primeiro passo rumo a compreensão da necessidade da luta popular nas ruas para alcançar suas reivindicações. Que se mantenham firmes no controle da nova Assembleia Constituinte.
 


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