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GREVE NEGRA DE 1857 NA BAHIA

A chamada Greve Negra foi um movimento paredista que começou em 1º de junho de 1857 e durou cerca de 12 dias, paralisando todo o serviço de transporte da cidade de Salvador- BA. Naquele tempo, trabalhadores negros africanos, afrodescendentes escravizados e outros já libertos compunham a estrutura do transporte de cargas, toneis de água e pessoas (em cadeiras específicas). Eram denominados ganhadores - escravos de ganho, pois vendiam a sua força física para todo tipo de serviço que a cidade necessitava. A importância desta atividade era enorme para Salvador, cidade com relevo acidentado, que dificultava a distribuição de mercadorias e pessoas.

O motivo da greve foi a insatisfação em relação a três situações específicas, implantadas pela administração municipal: o estabelecimento de imposto anual municipal para exercer o serviço; a obrigatoriedade de se usar uma chapa de metal, paga pelo operador, com número de inscrição e, para os que não fossem escravizados, a necessidade de se apresentar um fiador, pessoa idônea e detentora de posses, que pudesse garantir o bom comportamento deste transportador. As medidas desagradavam não só aos trabalhadores como também alguns senhores dos escravizados negros que ali viam um excesso de controle sobre os seus negócios com a escravidão.

Diante destas condições, os escravos e libertos se organizaram para fazer o movimento e exigir a revogação das exigências, sendo a principal delas a não utilização da chapa de metal, que causava descontentamento pois diziam que, assim, estariam sendo comparados a “animais”.

Durante os primeiros dias a cidade praticamente parou, o que obrigou os grandes comerciantes e a associação comercial a procurarem a presidência da província para relatar a gravidade da situação. As cargas se acumulavam no porto, mercadorias se deterioravam e nada circulava mais pela cidade. 

A reivindicação sobre o fim do imposto foi atendida pelo presidente da Província e o mesmo deixou de ser cobrado. Porém, a greve continuou pois a questão da chapa perdurava e se tornou a exigência principal a ser tratada a partir do 3º dia do movimento. Os ganhadores se recusam a usar a chapa que, além de ser equivalente à identificação de animais, deveria ser pendurada ao pescoço, tomando o lugar das guias dos santos que eles portavam. A necessidade de um fiador também era motivo de descontentamento, uma vez que a dependência de ser afiançado por um homem branco abonado era insustentável. 

Perdurando a greve, depois de uma semana, a câmara municipal flexibilizou sua postura e, além de abolir o imposto, alterou a necessidade de um fiador, substituindo por um “Certificado de abonação” em que os ganhadores poderiam ser abonados por pessoas físicas. Porém, a obrigatoriedade de se usar a chapa permaneceu. 

Com a publicação da nova postura, houve uma corrida dos ganhadores libertos para providenciarem os atestados que os permitiriam voltar para o trabalho. Nestes atestados, conforme consta nos documentos históricos da época, havia o seguinte registro: “acontece que a câmera municipal tem criado a Postura que obriga aos ganhadores a uzar de uma chapa que os distinga dentre os operários de outras classes, e que seja concedida a quem apresentasse attestado de sua boa conducta [...]”.  

No 12º dia da greve, muitos ganhadores já saiam às ruas usando a chapa, ainda obrigatória para que a atividade fosse exercida, sinalizando o final do movimento, embora alguns apresentassem resistência em portar a tal identificação. Nos dias que se seguiram, o sistema de transporte de Salvador entrou no seu ritmo normal.

A Greve Negra de 1857 atingiu parcialmente os seus objetivos. A diferença da condição social de cada trabalhador (escravizado ou liberto) denotou o desentendimento da necessidade de se lutar para além dos seus interesses pessoais, uma vez que aqueles que já eram livres precisavam do trabalho para garantir o mínimo da sua difícil sobrevivência. Mesmo assim, o movimento conseguiu atenuar as diferenças entre os grupos de negros explorados devido à necessidade de unidade para a luta comum. 

Naquele momento a utilização de mão de obra escravizada ainda era prática legal no Brasil e esta sublevação demonstrou a pré-disposição dos trabalhadores para lutar contra o sistema social vigente, extremamente violento e que desumanizava os negros. Demonstrou também que aquele grupo de ganhadores tinha a percepção de seu valor e que, de forma organizada, conseguiu parar todo setor de transporte fundamental para a rotina da cidade de Salvador, que, à época, era uma das maiores e mais importantes do país. A exploração da classe trabalhadora sempre encontrará obstáculos nas lutas dos explorados por seus direitos. Esse é o motor da história. É a partir das suas mobilizações que os trabalhadores conseguiram, conseguem e conseguirão suas maiores vitórias.
 


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