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Mulher, política, representatividade e gênero

Em tempos de disputas políticas emergem as díspares questões de gênero, de direitos civis e representação política feminina.

As mulheres são atropeladas pelo  patriarcado, que há séculos atravessa as relações sociopolíticas, enfronhadas nas instituições coletivas e privadas. O machismo estrutural remete as mulheres a um lugar de menor representatividade política e jurídica, das incrustadas “verdades” de serem “seres de alma inferior”, intuitivas e “despossuídas de razão e do conhecimento”.

Nossa cultura é herdeira da cultura  clássica ocidental, em que, na maioria dos casos,  ser ou estar mulher é estar cerceada e contida na “bolha” civilizatória histórica, excluídas da gestão e da representatividade política nos destinos do mundo. Os caminhos vivenciado são decorrentes de políticas estabelecidas majoritariamente por homens. 

Essa situação de opressão social e política vêm, expressivamente, ao longo da História, reforçando um suposto “valor moral” da mulher, que confirma a desconstrução política do ser feminino. Mesmo após os brasileiros terem levado ao poder, por duas vezes, uma mulher, Dilma Rousseff, elas ainda são vistas como “anexos” no cenário atual do Brasil, longe do exercício de cargos de governança pública e privada, de maneira ampla e consumada. A representatividade feminina é irrisória dentro dos escalões do poder público, executivo e parlamentar.

As quotas de gênero, determinadas nas eleições brasileiras, que estabelece uma porcentagem mínima nos lançamentos das candidaturas, visando determinar uma cota para as mulheres nas eleições proporcionais, são, em grande medida, burladas por candidaturas laranja. Assim, a presença de gênero masculino mantém-se fortalecida na engenharia política dominante.

São bancadas de homens que decidem e enquadram assuntos e conteúdo de políticas de gênero, enraizados em uma estrutura social erguida entre medos e não direitos, publicizadas diariamente como “benefícios”, concessões que, ao sinal de qualquer crise, são rapidamente arrancadas. 

Os desdobramentos dessas mentalidades cindidas são realidades escancaradas nas subjetividades de uma sociedade que se dobra ao machismo, aos julgamentos de condutas, impondo condições e apreensões no ir e vir em espaços públicos. O resultado de tal política são os altos índices de crimes de feminicídio, agressões verbais desqualificatórias, estupros, determinações de posturas morais e tantas outras premissas e consequências, tanto no âmbito privado, como no público.

Uma reflexão e uma análise social profunda mostram que as políticas públicas para o combate à opressão feminina são pífias, pois, ainda que atendam reivindicações das mulheres em suas lutas, não garantem a emancipação feminina. Na maioria das vezes, refletem apenas as rasas convicções do poder público sobre essa celeuma, que age de acordo com os interesses da classe econômica dominante que precisa manter a metade da classe trabalhadora (as mulheres) sob controle. A moral patriarcal cai como uma luva para esses interesses.

Ser mulher no Brasil é ter a consciência de que cotidianamente estamos em um campo adverso às nossas identidades, de um vivenciar escolhas alheias aos nossos corpos e distantes da nossa peculiar construção de pensamentos e desejos.

Ainda hoje, as mulheres percorrem estradas construídas por recalques internos, por sofrimentos íntimos, no caminho curto do não conflito, escamoteados de serem ditos e assumidos, com objetivos em não romper com a fantasia de um romantismo alienante e hipócrita da função da mulher na sociedade. Uma mentalidade enraizada pela sociedade capitalista, que aposta no embrutecimento e na subserviência de uma parcela significativa da classe operária.

Obviamente que neste processo houve avanços, mas as melhorias/crescimentos das pautas e vozes femininas ainda são tímidas, atrasadas no processo de tornarem regras concisas que subsidiem direitos e não benefícios.  Vozes femininas ainda são caladas pelos ditames do patriarcado. Mulheres negras têm suas origens escamoteadas pelo processo de branqueamento racial, mulheres trabalhadoras que têm que estudar mais e ganhar menos. Mulheres que geraram e construíram todos os seres humanos sem exceções, que gestam, junto aos homens, a sociedade do passado e do presente.

Nós, mulheres, somos uma comuna política e, como tal, temos como compromisso o exercício de uma reflexão de ancestralidade a ser realizada com olhos voltados para todos os processos sociais e políticos nesse mundo de “menos valia” da figura feminina. A empreitada é longa, mas fértil. Urgimos na tomada de consciência do que ser mulher, como processo interno da tomada da consciência de classe, é condição para rompermos com o machismo estrutural, que só terá sua base social e econômica com o fim da sociedade capitalista.

Foto: Luiz Rocha


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