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A tese do marco temporal e a democracia burguesa

No último dia 20 de outubro, o presidente Lula vetou 24 dos 33 artigos do Projeto de Lei 2.903/2023, conhecido como Marco Temporal, aprovado no Congresso Nacional em setembro. Lula tem sofrido ataques da direita, que vê no veto um ataque à proposta, e sido criticado pelos que lutam em defesa dos direitos dos povos originários e consideram o veto parcial uma concessão perigosa ao agronegócio. O Marco Temporal é uma tese jurídica, um critério para determinar se uma terra é ou não indígena. Tal critério adota como referência a presença de indígenas em uma determinada terra na data da promulgação da Constituição de 1988. Essa tese foi utilizada pela primeira vez pelo Supremo Tribunal Federal, STF, como um dos muitos critérios do julgamento da demarcação contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol, que fica em Roraima. Observando a vitória dos indígenas na aplicação da tese do Marco Temporal no caso da Raposa Serra do Sol, grupos ligados ao agronegócio passaram a tentar emplacar a tese como critério único para qualquer definição de demarcação de terras indígenas, ou seja, defendem que sejam reconhecidas apenas aquelas terras cujas populações estivessem ali na data da promulgação da Constituição de 1988.

Em agosto de 2021, o STF iniciou o julgamento sobre a constitucionalidade da tese do marco temporal como critério único para demarcação para terras indígenas e, em 20 de setembro de 2023, com votos 9 contra e 2 a favor, foi decidido pelo Supremo que ela é inconstitucional. No entanto, passados apenas 7 dias, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, CCJ, conseguiu formar entendimento contra a decisão do STF e liberou para votação, em regime de urgência, o Projeto de Lei nº 2.903/2023 que, ao contrário da decisão do STF, define o Marco Temporal como critério para demarcação de terras indígenas. O mais impressionante é que a votação ocorreu no mesmo dia, 27 de setembro de 2023, ou seja, em menos de 24 horas após a decisão da CCJ, 43 senadores concluíram que a tese derrotada no STF deveria prevalecer. Foram contrários à tese, 21 senadores. O caso explicitou a crise entre os Poderes instituídos pela democracia burguesa no Brasil.  Parlamentares da direita e da extrema-direita, principalmente aqueles ligados ao agronegócio, conhecidos como a bancada do boi, intensificaram o debate sobre limitar os poderes do STF.

Os sistemáticos ataques aos direitos dos povos originários as suas terras, perpetrado pelos grupos ligados ao agronegócio no Congresso Nacional, mostram como funciona a democracia burguesa. Mesmo sendo o STF um poder voltado aos interesses da classe dominante, ele vira alvo das forças reacionárias quando suas decisões contrariam seus interesses. O momento é propício para se fazer o debate com os trabalhadores sobre a falsa imparcialidade das instituições, que tomam, a cada passo, a forma dos interesses burgueses. O governo Lula só conseguirá avançar em defesa das pautas verdadeiramente democráticas se tiver apoio popular organizado nas ruas.
 


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