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Movimentos Separatistas em Alta: O Caso de Camarões

Camarões, país localizado na costa Ocidental da África, está passando por uma enorme turbulência política. Segundo a Anistia Internacional, no dia 01 de outubro, 17 pessoas morreram em confronto separatista entre uma minoria anglófona – de língua inglesa – contra a maioria francófona – de língua francesa.  As fontes oficiais confirmam as mortes, todas de civis, entre eles dois nigerianos. Os confrontos começaram após dois grupos anglófonos, um localizado na região noroeste, outro na região sudoeste, convocarem e realizarem protestos contra o que chamam de “marginalização do governo de Paul Biya”, dominado por francófonos. As testemunhas afirmam que as forças repressivas abriram fogo contra os civis a curta distância.

Houve a proclamação simbólica da independência dessas duas regiões, sendo que os anglófonos representam 20% da população. A data da proclamação, 01 de outubro, tem valor simbólico, uma vez que diz respeito à data que, em 1961, significou a unificação das zonas de expressão francesa e inglesa. Outra política defendida é o retorno ao federalismo, que foi vigente entre 1961 e 1972, com dois Estados diferentes no comando da mesma república. Os independentistas defendem que a região anglófona passe a se chamar Ambazónia.

Camarões não tem o mesmo prestígio internacional que a Espanha. Enquanto a justa e necessária discussão sobre o separatismo da Catalunha ocupa grande espaço na imprensa, o caso camaronês é varrido para “debaixo do tapete”. Apesar de o Brasil ser um país de maioria negra, com uma enorme influência social e cultural africana, aparentemente há uma “cortina de ferro” que impede que notícias sobre a África cheguem aos noticiários brasileiros. Esquecimento pensado e programado. Desde o século XIX, há uma tentativa capitalista de apagar e negar o conhecimento sobre o continente africano, de forma a facilitar e naturalizar sua espoliação pelo imperialismo.


Fronteiras falsas, problemas reais



Em 1885, ocorria na Alemanha a Conferência de Berlim. Entre 15 de novembro de 1884 e 26 de fevereiro do ano seguinte, representantes da Alemanha, Áustria-Hungria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, Império Otomano, Itália, Noruega, Países Baixos, Portugal, Rússia e Suécia se sentaram nas mesas de negociações com o objetivo de regularizar o comércio com a África e organizar como seria a ocupação dos territórios africanos.

O resultado da Conferência foi a divisão do território entre zonas de colonização. Sob a premissa da superioridade ideológica, civilizacional e racial do continente europeu, a hipócrita justificativa para o processo colonial foi levar “a luz da civilização” para os “bárbaros africanos” e guiá-los no caminho inexorável ao progresso civilizacional. Além de ser uma grande ofensa, por insinuar a inferioridade dos africanos, é uma grande “conversa fiada”. Assim como em todas as campanhas imperialistas, a única intenção é garantir os lucros dos capitalistas.

Porém, esse não foi o maior problema que acarretou a Conferência de Berlim. O continente africano tem mais de uma centena de grupos étnicos, com culturas, dialetos e formas de organizações políticas e sociais próprias. No momento da gananciosa divisão do continente, não foi respeitado os limites políticos anteriores. Dessa forma, foram unidos em uma mesma colônia diferentes grupos étnicos, por vezes rivais históricos. Após meio século de colonização, teve início o processo das independências dos países africanos. Com isso, todos os problemas inerentes da colonização vieram à tona.

Pelo fato de não se ter respeitado os limites étnicos, após passarem pelas guerras de independência, vários países africanos passaram por guerras civis. O processo caminhou para genocídios, como no caso de Burundi e Ruanda, quando um grupo étnico rival era minoria absoluta perante outro. Isso tem reflexo direto no Camarões hoje, quando uma minoria é oprimida pela maioria.


Para a África é socialismo ou barbárie



O capitalismo devastou a África no período pré-colonial e colonial. No período pós colonial, a espoliação continua. Em primeiro lugar, a colonização africana não foi uma colonização de povoamento, mas de pura e simples exploração. Não era importante criar infraestrutura mínima para garantir algum bem estar nas colônias. Era necessária apenas a construção de estradas para o escoamento de matérias primas e para interiorização do comércio.

Em segundo lugar, e ainda mais grave, foi o fato de o FMI (Fundo Monetário Internacional) condicionar a ajuda “humanitária” econômica para a reconstrução dos países africanos, que haviam passado por guerra de independência e vários deles por guerras civis, à remoção de qualquer envolvimento do Estado na economia. Seus ditames incluíam a remoção de subsídios, liberalização das instituições financeiras, privatização de 90% das estatais e o encolhimento da força de trabalho no setor civil. O resultado foi desastroso. As economias incipientes foram destroçadas e os já limitados investimentos em infraestrutura foram reduzidos praticamente a zero.

O mais perverso efeito desta “ajuda” foi destruir os setores agrícolas e a capacidade de alimentar as pessoas de uma nação com uma produção própria, uma vez que as terras cultiváveis foram redirecionadas a plantios interessantes ao mercado externo. Como resultado, desde 1980, virtualmente todas as nações africanas dependem de alimentos importados. A incoerência do sistema neoliberal tem como auge o caso da Etiópia. O país é o segundo maior produtor de milho e o principal produtor de café do continente, e é o 10º maior criador de gado do mundo. Ainda assim, cerca de oito milhões de etíopes são ameaçados pela fome.

Escravidão, colonização que não levou em consideração o preexistente sistema político existente em África, guerras de independência, guerras civis, fome, desemprego e desespero. Esse é o legado do imperialismo e do neoliberalismo para o continente africano. A LPS (Luta pelo Socialismo), assim como no caso da Catalunha, se posiciona contrária à repressão estatal do governo camaronês e a favor da livre determinação dos povos. Afinal a luta por direitos democráticos é uma das etapas da luta revolucionária e, portanto, deve integrar e refletir os anseios da classe trabalhadora. Porém, a experiência histórica do continente africano mostra que não há possibilidades de mudanças efetivas dentro do capitalismo. A luta africana, e de todas as classes oprimidas, é pelo socialismo. Fora isso, só resta barbárie.


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