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Capitalismo e a escravidão

A escravidão é a prática em que um ser humano assume direito de propriedade sobre outro, imposta através da força. É um meio de produção em que o escravizado perde sua própria condição de ser humano, tornando-se uma mera mercadoria. Embora tenha se tornado algo descomunal a partir da escravidão negra na era moderna (1444-1889), a existência de escravos remonta à antiguidade.

Existem diferentes formas de um ser humano ter se tornado escravizado durante a história. A que produzia escravizados em maior quantidade era a escravidão por guerra. No passado, em lugar do inimigo de guerra derrotado ser morto ou preso, ele se tornava escravizado. Havia também a escravidão por dívida, em que o devedor trabalhava como escravo do credor até pagar seus débitos. Outra forma era a escravidão enquanto sentença jurídica, em que alguém que tenha cometido algum crime era convertido em escravo.

Na Grécia Antiga, principalmente em Esparta, a escravidão era o principal meio de produção. Uma das causas do fim do Império Romano foi a dificuldade de obter novos escravizados a partir do momento em que o Império atingiu sua máxima extensão territorial, uma vez que a escravidão era o principal meio de produção. Embora durante a Idade Média, momento entre os séculos V e XV, a escravidão tenha perdido grande parte de sua importância produtiva na Europa, continuava a pleno vapor na África, na Ásia e nas Américas.

Porém, a escravidão negra na Era moderna tem diferenças fundamentais do que ocorreu anteriormente. Pela primeira vez, havia um claro critério étnico por trás da escravidão, que era a cor da pele dos escravizados. Além disso, nesse momento, o escravizado era colocado dentro de um navio e levado para outro continente, do outro lado do Atlântico. Por fim, e mais importante, havia um claro critério econômico que ia além da pura e simples exploração do escravizado.

Foi montado uma verdadeira máquina econômica para se extrair a mais valia em todo o processo: na compra dos escravizados nos portos africanos, na sua venda nos portos americanos, na venda da produção do trabalho escravo para o mercado externo e nas péssimas condições de vida e de trabalho a que eram submetidos os escravizados. Em suma: os europeus fizeram da escravidão negra uma imensa lógica de mercado.


A tese de Eric Williams


Erick Williams foi um historiador de Trinidad e Tobago, onde foi primeiro ministro, entre 1962 e 1981. Em sua carreira como historiador, o que lhe deu mais destaque foi o livro publicado em 1944, chamado “Capitalismo e Escravidão”. Este livro, de gigantesca repercussão, colocou a escravidão negra no cerne da formação do mundo capitalista.

Segundo Williams, a escravidão negra e o tráfico de escravos geraram o capital que financiou a Revolução Industrial. Ele argumentou que a riqueza da Europa se deu graças a exploração de mão de obra africana e do próprio tráfico de escravos. Com relação a Inglaterra, onde estourou a Revolução Industrial no final do século XVIII, esse caso era ainda mais elucidativo. De acordo com a base de dados do “O Comércio Transatlântico de Escravos”, dos 12.521.337 escravizados comprados nos portos africanos, os ingleses eram responsáveis por 3.259.440, números menores que os portugueses. Desse total, 2.542.297 escravizados foram comprados no século XVIII, justamente o século da Revolução Industrial. Isso não é uma coincidência.

De acordo com Williams, o lucro dos ingleses não se dava apenas no momento do tráfico de escravizados. Ao trocar os escravizados por produtos manufaturados no seu próprio país, os ingleses contribuíam para o desenvolvimento de sua indústria doméstica. Uma vez chegado na América, os negros trabalhavam como escravos nas plantações, onde produziam mercadorias que serviam de matéria-prima e estimulavam a atividade industrial na Inglaterra. Dessa forma, a escravidão proporcionou mão de obra, matéria prima e escoamento para os produtos industrializados ingleses.

Com esse cenário, foi possível uma acumulação primitiva de capital, do que a Inglaterra se serviu para chegar ao estágio do capitalismo industrial. Em suma, uma das bases materiais para o nascimento do capitalismo advêm do trabalho, suor e sangue de milhões de pessoas de quem foi retirada a condição de ser humano. A exploração do homem pelo homem é a base do capitalismo.


Racismo e a nova escravidão


O objetivo final do capitalismo sempre será a máxima extração de lucro em cima da produção. Dessa forma, a exploração da mão de obra até o seu limite é de total interesse. Enquanto foi possível e lucrativo, essa forma de exploração se deu através da escravidão legalizada, controlada pelo próprio Estado.

Um dos efeitos da escravidão negra foi o racismo. Embora não haja mais o escravismo enquanto meio legal de exploração de mão de obra, a ideologia racista se valeu da polarização entre burgueses e proletários para se desenvolver. Hoje, o racismo serve para legitimar socialmente a opressão ao povo negro, que possuí os piores postos de trabalho, recebem menos para executar o mesmo serviço, sofrem um verdadeiro genocídio promovido pelo próprio Estado e está de tal forma enraizado que divide a própria classe trabalhadora. Conforme afirmou Malcom X, “não existe capitalismo sem racismo”.

Retornando à escravidão em si, embora ela tenha sido abolida há mais de um século, ainda hoje estouram denúncias sobre relações de trabalho análogas à escravidão, principalmente no campo e na grande indústria. Mais que isso, com as reformas que estão sendo colocadas em prática pelo governo golpista de Michel Temer, como a Reforma Trabalhista e a da Previdência, está sendo retomada tal precarização da classe trabalhadora, que a única diferença que restará em relação à época da escravidão será a “liberdade” que os proletários terão em escolher para qual burguês trabalhar. E mais uma vez, já que constituem o grosso do proletariado, será o povo negro o mais atacado.

A mesma elite econômica que manteve a escravidão por séculos, agora toma medidas para a total exploração do proletariado. Porém, assim como ocorreu durante a escravidão, em algum momento, em virtude dos ataques sofridos, os oprimidos se colocarão em movimento contra o sistema. Nesse momento, não será nenhuma medida reformista ou eleitoral dentro da democracia burguesa que dará conta de reverter os ataques. Para isso, é necessária uma total quebra com o sistema capitalista, uma revolução, rumo ao socialismo.


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