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A Iª Internacional e a solidariedade entre os trabalhadores

No dia 28 de setembro de 1864, cerca de dois mil trabalhadores se reuniram no salão do Edifício St. Martin`s Hall, no centro de Londres. Estavam ali reunidos numa assembleia, principalmente os trabalhadores ingleses e franceses, para discutir um problema concreto que estavam sofrendo. Toda vez que a classe operária de um país lutava por melhores salários e pela redução da jornada de trabalho, os capitalistas ameaçam trazer trabalhadores de outros países para ocuparem o lugar dos que estavam em greve ou demitidos. Nesta assembleia, discutiu-se a necessidade de fundar uma organização estruturada e permanente entre os operários dos diversos países. Foi assim que nasceu a Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT).

O Conselho Geral (CG) era o órgão coordenador das ações da Associação que funcionava de forma federativa, com bastante autonomia para suas sessões nacionais. O sindicalismo inglês, por exemplo, bastante reformista, lutava principalmente pelas questões econômicas como melhores salários e condições de trabalho, sem questionar a própria existência do capitalismo. A Associação abrigava também os mais diversos grupos ideológicos da esquerda, como anarquistas, marxistas e proudhonianos. Esses últimos eram seguidores do socialista utópico francês Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865), que foi o pai do anarquismo, e se opunham ao envolvimento dos trabalhadores na política e contrários à greve como instrumento de luta. Eram, portanto, a ala direita da Associação.

O grupo dos comunistas (socialistas científicos) estava reunido em torno a Karl Marx (1818-1883) e propunha a luta política para a derrubada do capitalismo. Entre os representantes da Alemanha, também havia os seguidores de Ferdinand Lassalle (1825-1864), que viam na luta política parlamentar, restrita aos limites nacionais, a melhor forma de melhorar as condições de vida dos trabalhadores.

Agrupar tão díspares formas de pensamento em torno de um programa comum sempre foi uma tarefa extremamente difícil, quase impossível. Mas coube a Marx dar unidade às elaborações classistas da Internacional, fazendo diversos desses grupos se manterem na Associação. Ele se tornou a “alma” do CG e redigiu praticamente todas as resoluções, documentos preparatórios para os encontros e relatórios para os Congressos. Ele conseguiu fazer convergir as diversas formas de pensamento da luta política e econômica, restringir os sectarismos e os reformismos, apontando sempre para uma perspectiva internacionalista. Marx dedicou-se à Iª Internacional. Em novembro de 1871, escreveu à Friedrich Bolte: “a história da Internacional foi uma luta contínua do Conselho Geral contra as seitas e as tentativas de amadores que procuravam afirmar-se contra o movimento real da classe operária no interior da própria Internacional. Essa luta foi conduzida nos congressos, mas muito mais ainda nas negociações privadas do Conselho Geral com cada uma das secções.”

A Iª Internacional auxiliou os trabalhadores nas mais diversas lutas e constituiu-se numa força política em todo o mundo, mas principalmente na Europa, e não era legalmente reconhecida em diversos países, tendo seus membros perseguidos, presos e deportados. Ela foi a ferramenta que, através de um programa socialista, fez avançar a consciência dos trabalhadores contra as artimanhas do capitalismo que se movimentava para além das fronteiras nacionais.

Dentre os vários acontecimentos em que a Internacional participou, deve-se destacar a Comuna de Paris (1871), embora não a tenha dirigido. Marx inclusive havia apontado a impossibilidade dela se tornar vitoriosa, mas, uma vez que aconteceu, foi seu principal defensor. A Comuna foi o primeiro governo operário da história e por ele foram feitas mudanças radicais. O internacionalismo esteve presente na Comuna e dela faziam parte diversos estrangeiros: belgas, húngaros, italianos, dentre outros. Ou seja, o fato de ser de outro país era irrelevante. A Comuna decretou o fim do trabalho noturno; a ocupação e desapropriação de residências vazias; a igualdade entre os sexos; a redução da jornada de trabalho; legalização dos sindicatos; a gratuidade da educação, laica e compulsória, além da dissolução da burocracia estatal e dos órgãos de repressão, substituídos por milícias armadas dos trabalhadores etc. Mas, infelizmente a Comuna ficou circunscrita à Paris. Cercada pelos inimigos internos e externos, ela foi derrotada depois de pouco mais de dois meses. De 21 a 28 de maio de 1871, cerca de 10 mil communards foram mortos em combate e mais de 43 mil foram feitos prisioneiros. Marx escreveu a Mensagem do Conselho Geral internacional sobre A Guerra Civil na França, que foi aprovado por unanimidade no CG.

Com a derrota da Comuna de Paris, os membros e todas as sessões da Internacional passaram a sofrer enormes perseguições. Um dos primeiros atos do governo francês foi proibi-la no País, além de solicitar que a Inglaterra fizesse o mesmo. O Papa Pio IX a condenou com veemência. Representantes da Alemanha e do Império Austro-Húngaro escreverem um documento condenando-a e conclamando uma ação conjunta entre todos os governos contra suas atividades danosas. Paradoxalmente, foi neste período que a Internacional mais cresceu e tornou-se mais importante. Os operários viram que era possível construir um mundo sem a burguesia, sem exploração. Suas influências se tornaram tão evidentes que ela obteve desde a Itália o apoio de Giuseppe Garibaldi (1807-1882), que escreveu na sua carta de adesão: “A Internacional é o sol do futuro”. Trabalhadores australianos e neozelandeses solicitaram admissão. Os operários ingleses em Calcutá e os artesãos de Buenos Aires faziam seus requerimentos de apoio.

De setembro de 1864 a julho de 1876, a Associação Internacional dos Trabalhadores, a Iª Internacional, foi capaz de imprimir na consciência dos trabalhadores que a sua libertação só poderia ser obra de sua própria luta e que essa luta não poderia se circunscrever nos limites das nações.


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