• Entrar
logo

Estado, Regime e Governo – O Regime Político – Parte III

Leon Trotsky, em seu artigo de 1935, intitulado “Outra vez sobre a questão do bonapartismo. O bonapartismo burguês e o bonapartismo soviético” define assim o regime bonapartista: “Entendemos por bonapartismo o regime na qual a classe economicamente dominante, ainda que conte com os meios necessários para governar com métodos democráticos, se vê obrigada a tolerar, para preservar sua propriedade, a dominação incontrolada do governo por um aparato militar e policial, por um ‘salvador’ coroado. Esse tipo de situação se cria quando as contradições de classe tornam-se particularmente agudas; o objetivo do bonapartismo é prevenir as explosões (...). Como ponte entre a democracia e o fascismo, aparece um ‘regime pessoal’ que se eleva acima da democracia e concilia com ambos os lados, enquanto protege os interesses da classe dominante; basta dar esta definição para que o termo bonapartista fique totalmente claro”.

Então, o regime político de tipo “bonapartista” é caracterizado pelo protagonismo das instituições repressivas do aparelho do Estado, numa conjuntura de ascenso operário, ou de potencial ascenso, combinado com uma crise tal na burguesia que resulta em que nenhum setor burguês tenha capacidade de impor cabalmente o seu projeto.

Assim, o aparato policial e a burocracia do Poder Executivo se sobrepõem às frações burguesas debilitadas e representando o conjunto da classe dos capitalistas, funciona como uma espécie de árbitro aparentemente acima da sociedade.

A ação prioritária do regime bonapartista é atacar a resistência do movimento operário organizado, mas também atinge setores da burguesia com a restrição das liberdades democráticas.

No regime bonapartista há uma hipertrofia do Poder Executivo em relação ao Legislativo e ao Judiciário, com uma centralização política apoiada a partir da burocracia estatal, das Forças Armadas e das forças policiais.

A normalidade constitucional é suplantada e se instala uma espécie de estado de exceção permanente. As eleições se tornam plebiscitárias e o chefe de Estado, líder máximo carismático, arbitra os conflitos diretamente entre os setores das classes em disputa. O discurso é sempre para “combater” a corrupção, manter a ordem e a paz social, proteger a população, etc.

O nome “bonapartista” faz referência ao regime político implantado na França, por Luís Bonaparte, após o golpe de Estado de 1851, momento em que este aparece como “garantidor” da ordem capitalista quando nenhum outro setor de burguesia representado no parlamento tinha condições de garantir. Tal regime se estabelece a partir da destruição do regime parlamentar burguês. Esse golpe de Estado foi estudado por Marx e magistralmente registrado na sua obra, de 1852, “O 18 de brumário de Luís Bonaparte”.

Com base na analise marxista da realidade, é possível verificar que no Brasil, hoje, estamos num momento de transição do regime democrático burguês para um regime bonapartista. Indicações de fechamento do regime, com várias medidas de exceção, podem ser vista a partir da Operação Lava Jato, com conduções coercitivas sem intimações; prisões preventivas muito longas, o que na prática se configuram como uma tortura que funciona como forma de pressão para que o preso faça confissões e acordos de delação premiada que delate justamente quem eles querem que seja delatado; vazamento seletivo de informações sigilosas; grampos e vazamentos ilegais – envolvendo inclusive a presidência da República, etc.

Outro exemplo foi o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, que com a desculpa de “pedaladas fiscais”, se configurou como um verdadeiro golpe parlamentar, fazendo assumir o vice-presidente, Michel Temer, para aplicar um programa econômico abertamente pró-imperialista. Mas esse governo, conformado pela ala burguesa que restou da frente popular, pelo PSDB e todos os outros partidos da direita, também se demonstrava fraco para a enormidade da tarefa: ter que aplicar planos de arrocho e espoliação inauditos e ainda conter o movimento de massas para garantir o sucesso da empreitada, isso tudo em meio a uma tremenda crise econômica.

Daí segue que o imperialismo norte-americano, por meio de seus agentes nacionais, avançou na linha, não só de detonar com o governo, mas de destruir o regime político. Depois do PT, passou a atacar o PMDB, os outros partidos e até setores do PSDB. Agora já não mais só com a Lava Jato, mas diretamente com o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, e com o Supremo Tribunal Federal, principalmente com o ministro Edson Fachin. As delações de Wesley Batista, dono da JBS, são exemplos cabais dessa política.

Já agora não mais são o executivo e o legislativo as principais instituições que comandam o Estado burguês no Brasil, mas sim o Poder Judiciário. O regime surgido desde a queda do regime militar acabou. O regime democrático burguês clássico no Brasil já não existe mais. O aparato burocrático judicial-policial é quem dá as cartas hoje. O Ministério Público Federal, o Supremo Tribunal Federal e os outros Tribunais Superiores, a Polícia Federal, a Operação Lava Jato (articulados com a CIA), o Mossad e o Departamento de Estado norte-americano e Israelense estão comandando um regime político reacionário, de exceção, de transição para um regime político de tipo bonapartista.

O golpe de Estado parlamentar evoluiu para o golpe do judiciário. Mas o aparato burocrático-policial precisa de um representante que possa centralizar o poder político. E esse só pode ser um poder executivo extremamente forte, que governe com “mão de ferro” contra toda e qualquer resistência dos trabalhadores. Por isso, esse regime reacionário atual é de transição para um regime bonapartista.

Isso porque o aprofundamento da crise econômica e o necessário ataque contra o nível de vida dos trabalhadores como critério elementar para tentar manter a níveis satisfatórios a tendência de queda na taxa média de lucros, que se acentua vertiginosamente em tempos de crise econômica global, fará com que o movimento operário se levante. Portanto, já estão preparando um regime duro para barrar esse levante.

A burguesia sabe que ainda que a burocracia operária, encabeçada pela cúpula do PT e da CUT, tenha militado para segurar um ascenso do movimento operário e, em última análise, ser a grande responsável pela manutenção do regime burguês, trata-se de uma burocracia fraca. A tendência para o próximo período é de maiores ataques à classe operária e ela vai responder à altura. O mais provável é que virá um grande ascenso do movimento de massas, que transbordará o controle da burocracia, como sempre aconteceu no curso da história.

A burocracia será ultrapassada e os planos da burguesia serão frustrados, o regime se esfacelará de vez com o movimento operário dando a dinâmica da situação política, arrastando atrás de si a maior parte da pequena burguesia e as massas de conjunto, abrindo uma situação pré-revolucionária no País.

Os capitalistas se preparam para essa realidade. Tudo é de caso pensado, nenhum ponto é sem nó. E não podemos ser ingênuos tendo esperança na “democracia” ou, pior, que “não há golpe algum” e que tudo vai se resolver nas eleições. Na verdade, “tudo vai se resolver nas eleições” como saída burguesa para a crise política. O que os burgueses querem é um processo eleitoral com os trabalhadores controlados e iludidos que a solução de seus problemas passa pelas eleições.

Pois para implantar um regime bonapartista é necessário um executivo forte – o respaldo e a legitimidade de um presidente vêm de uma vitória eleitoral convincente.  E essa é a tática patronal. Desgastar os partidos políticos e o parlamento e jogar peso para eleger um elemento de direita para, na primeira oportunidade, fechar o Congresso, dar um autogolpe e governar por decreto, aprovando goela abaixo das massas todas as reformas e abominações contra os trabalhadores. E com a Polícia e as Forças Armadas nas mãos, sufocar toda e qualquer revolta operária.

O estabelecimento de um regime bonapartista no Brasil seria a terceira fase do golpe de Estado, após o golpe parlamentar e o golpe do judiciário, que está em andamento, num processo para desembocar num regime fascista, de destruição total das organizações operárias e de terror aberto contra a população de conjunto.

Essa é a política do imperialismo para o Brasil. Essa é a lógica do golpe. Bastará ver qual será a reação do movimento de massas, pois a única força capaz de frustrar os planos da burguesia e barrar o golpe de Estado em andamento é a força dos trabalhadores mobilizados nas ruas.


Topo