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Financiamento de estudantes: solução ou problema?

O Programa Universidade para Todos (PROUNI) e o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) são duas das principais formas de acesso de estudantes de baixa renda, oriundos do ensino básico público, ao ensino superior. O PROUNI é um programa do Ministério da Educação, criado pelo Governo Federal, em 2004, que oferece bolsas de estudo integrais e parciais (50%) em instituições privadas de educação superior, em cursos de graduação e sequenciais de formação específica. Já o FIES, criado durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1999, e ampliado no governo de Luís Inácio Lula da Silva, é destinado à concessão de financiamento para estudantes em cursos superiores não gratuitos, com avaliação positiva nos processos conduzidos pelo Ministério da Educação. Tal programa é um sucessor do Crédito Educativo, criado em 1976, pelo regime militar. Nesse caso, as condições para concessão do financiamento ao estudante são definidas entre o agente financeiro operador do crédito (banco), a instituição de ensino superior e o estudante.

Ambos os sistemas servem a um número alto de alunos. No segundo semestre de 2017, foram concedidas 147.815 bolsas do PROUNI, sendo 67.922 parciais e 79.883 integrais. Embora os dados sobre os financiamentos pelos FIES sejam mais escassos, uma pesquisa publicada pelo jornal burguês Folha de São Paulo, em 2016, mostrava que ao menos um entre três alunos do ensino superior privado contava com um subsídio do governo para manter seus estudos.

Um dos grandes problemas desta forma de acesso ao ensino superior é que o estudante se forma e acessa o mercado de trabalho já com uma dívida gigantesca. Num período de crise econômica como o atual, com um alto número de desempregados e pessoas tendo que recorrer ao trabalho informal para se manter, o indivíduo por muitas vezes se forma e não possuí condições de arcar com a dívida contraída para se formar. As taxas de juros continuam existindo e a dívida se torna uma verdadeira “bola de neve”.


Exemplo negativo nos Estados Unidos

Esse tipo de relação de financiamento entre governo, instituição privada de ensino superior e alunos não é uma particularidade do Brasil. Essa é a principal forma de acesso ao ensino superior nos Estados Unidos, lugar onde o ensino público foi totalmente secundarizado e precarizado – cerca de 70% dos alunos procuram algum tipo de financiamento para ingressar e concluir o ensino superior.

A situação é alarmante. Os dados oficiais mostram que apenas a dívida estudantil estadunidense ultrapassou a casa dos US$ 1,5 trilhões. Para os recém-formados, as perspectivas são dramáticas. Foi o caso da ex-estudante entrevistada pela BBC Brasil, Carolyn Chimeri. Buscando uma vida melhor, graduou-se e fez mestrado em duas das melhores universidades estadunidenses. Com 29 anos, após se formar, a dívida acumulada por Chimeri é de US$ 238 mil, que ela tenta pagar com um salário de professora. A entrevistada afirma que mesmo pagando parcelas todos os meses, a sua dívida pouco diminuiu por causa dos juros de 8% ao ano, valor muito próximo aos 6,5% cobrados pelo FIES. Outra ex-estudante entrevistada pelo jornal, habitante do estado de Montana, afirma que, por causa dos juros, o empréstimo de US$ 30 mil que pegou para completar a faculdade, em 1993, hoje alcança US$ 300 mil, embora jamais tenha deixado de pagar parcelas.

A diretora da ONG Student Debt Crisis, instituição que visa reformar a forma do financiamento estudantil estadunidense, Natalia Abrams, afirmou que algumas pessoas com grandes dívidas ficam devendo pelo resto da vida. Segundo ela, 20% dos americanos com mais de 50 anos têm dívidas estudantis. Ou seja, com a ambição de estudar e “melhorar” de vida, uma grande parte dos estadunidenses acaba se amarrando por toda a sua vida a uma dívida que não poderá ser paga.

Além das taxas irreais de juros, que tornam a dívida quase impossível de ser quitada, ainda há outros problemas com esse tipo de financiamento. Mesmo no Brasil, onde esse modelo é mais recente, já existe alguns indícios de fraudes no FIES por parte das instituições de ensino superior privadas. Em março de 2018, alunos da Universidade Anhanguera UNIDERP, localizada no Mato Grosso do Sul, denunciaram os lançamentos de valores maiores do que o que deveria ser cobrado pela universidade a alunos subsidiários pelo FIES. Uma das vítimas, que preferiu não ser identificada, descobriu que a universidade tinha recebido do Ministério da Educação o valor de R$ 24.270,20, sendo que o montante que ela deveria pagar pelo semestre era de R$ 22.857,65. Quando procurou a universidade para cobrar explicações, abafaram o caso e não lhe deram explicações plausíveis. Juros exorbitantes e fraudes são elementos comuns aos financiamentos para o ensino superior privado. É isso que o Brasil vem copiando dos Estados Unidos.


Por uma educação pública, de qualidade e acessível a todos

A pergunta que fica é: por que financiar alunos nos centros privados de ensino superior em lugar de aumentar as vagas nas instituições públicas de ensino, garantindo também a permanência dos estudantes de baixa renda nessas instituições através de concessão de bolsas para hospedagem, material acadêmico e deslocamento?

Isso nos dá provas de quem realmente governa o mundo. Os grandes grupos capitalistas, que atuam nos bastidores dos governos nacionais, acabam por fazer passar medidas que beneficiarão seus próprios bolsos, em detrimento do investimento em educação pública. No Brasil, grande colônia do imperialismo estadunidense, o que estamos assistindo é uma verdadeira ofensiva dos gigantescos monopólios educacionais.

A citada Universidade Anhanguera foi comprada, em 2013, pelo grupo Kroton, monopólio estadunidense que atua através da conformação de trustes e holdings e tinha o objetivo de se tornar o maior monopólio educacional do mundo. Isso deu origem a um grupo que naquele momento foi avaliado em US$ 13 bilhões, que já em seu nascimento se tornou a maior empresa do setor de educação do mundo.

Enquanto o FIES e o PROUNI vêm se tornando as principais ações governamentais na promoção do acesso ao ensino superior, o Programa de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), que visava expandir o acesso e número de vagas em universidades públicas, sofreu um contingenciamento de 40,1% do capital disponível, de acordo com pesquisa feita pelo Fórum dos Pró-reitores de Planejamento e Administração das Instituições Federais de Ensino Superior.

Isso, em conjunto com os mais de R$ 13 bilhões em cortes nos investimentos federais em ciência e tecnologia, mostram que a universidade pública, gratuita e de qualidade está com os dias contados. O momento é de mobilização nacional pela defesa da educação. A educação pública é uma conquista histórica da classe trabalhadora e deve ser defendida. Se não lutarmos agora, será tarde demais.


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