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Indígenas da região com mais grupos isolados do mundo pedem socorro

No último dia 07 de junho, habitantes da Terra Indígena (TI) Vale do Javari, no Amazonas, região com mais grupos isolados e de recente contato com o hemisfério ocidental, pediram socorro às autoridades depois da confirmação de pelo menos quatro casos de Covid-19 entre os profissionais da saúde que atuam na região e outros sete entre os indígenas, conforme dados do Governo Federal. A situação, no entanto, pode ser ainda pior, uma vez que a prefeitura de Atalaia do Norte (AM) fala em 12 casos confirmados entre indígenas na sua jurisdição. 

O medo da propagação da doença é enorme e pode significar a dizimação de comunidades inteiras. “Eles tiveram contato com vários indígenas, a probabilidade de estarem infectados é muito grande. Nosso medo é agora se espalhar por outras aldeias”, afirmou o representante da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Manoel Chorimpa. Em nota à sociedade brasileira e internacional, divulgada também no 7 de junho, a Unijava denuncia a falta de testes para a Covid-19 em todas as aldeias, ausência de meios de remoção rápida dos doentes, além da carência de barreiras sanitária nas principais entradas das terras indígenas. 

O analista pericial em antropologia do Ministério Público Federal, Walter Coutinho Jr, emitiu, dias antes, em 5 de junho, um alerta à 6ª Câmara da PGR (Procuradoria Geral da República), em Brasília, sobre a aproximação de uma grave crise sanitária no Distrito do Vale do Javari, em decorrência da possível contaminação das comunidades indígenas pelo novo coronavírus. O analista também apontou a pouca transparência sobre os números da pandemia na região.

Com uma das maiores diversidades étnicas do mundo, a TI Vale do Javari é o “santuário ecológico na fronteira entre Brasil e Peru”, cujo território equivale aos da Suíça e da Dinamarca somados. As distâncias imensas entre aldeias só são vencidas por helicóptero ou muitos dias de barco. A região abriga seis etnias que mantêm contato com a sociedade nacional e há registro de pelo menos 16 grupos isolados.

Os piores temores dos indígenas e indigenistas começam a se confirmar com a chegada da pandemia: o medo de contaminações em massa entre mayorunas, matís, kanamaris, kulinas, korubos e tsohom-djapás, além de uma sombra que se projeta sobre os grupos que ainda vivem sem contato no meio da floresta Amazônica. 

Outra denúncia feita pela Univaja afirma que além dos casos confirmados na região, lideranças nas aldeias já relatavam que 15 indígenas e cinco famílias na aldeia São Luiz, no rio Javari, apresentavam sintomas parecidos com os da Covid-19. Aproximadamente 244 pessoas vivem na aldeia e há apenas 60 testes disponíveis. Além disso, a mesma aldeia sofre com um surto de malária que afeta grande parte da comunidade. 

Na nota, os indígenas relatam o fato de a doença ter chegado à região a partir das equipes de profissionais da Secretaria Especial da Saúde Indígena (Sesai) e também através das frequentes invasões de pescadores, madeireiros e caçadores ilegais. A Unijava afirma que tem alertado constantemente a Funai sobre a presença de invasores na região. 

A necessidade de evitar a rotatividade de equipes de saúde na região para reduzir o risco de contaminação já havia sido informada ao Distrito Sanitário da Sesai no Vale do Javari, mas, mesmo com o perigo eminente, as equipes adentraram nas aldeias sem que as providências necessárias para conter o avanço da doença fossem tomadas. Tal fato é uma demonstração do total descaso dos órgãos governamentais em relação à saúde dos povos indígenas. A política anti-indígena do atual governo ignora, inclusive, a complexidade do território. A lenta e ineficaz resposta das autoridades às epidemias como malária, coqueluche e hepatites levam vários indígenas ao óbito.

Após uma longa história de dizimação, desde a chegada dos invasores europeus no século XVI, muitos povos indígenas resistiram e até conseguiram aumentar sua população a partir de políticas de proteção e defesa. Porém, hoje, estão mais uma vez diante do risco de serem reduzidos por uma doença dos não-indígenas.
 


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