Este antigo dito popular descreve bem a moderna contradição do sistema capitalista e também expõe a incrível hipocrisia do imperialismo estadunidense, que ainda tem a capacidade de nos surpreender. No último dia 7 de março, o Comitê de Energia e Comércio da Câmara dos Deputados americana (House Committee on Energy and Commerce) aprovou, por unanimidade, um Projeto de Lei (PL) que exige que a rede social “TikTok” seja vendida pela ByteDance, a companhia chinesa que detém a marca, para uma empresa norte-americana. Caso a venda não se concretize, a rede social seria banida do País.
A justificativa que respalda esse PL é, para variar, a ameaça do “espectro do comunismo que ronda” os EUA. Segundo os defensores da proposta, a rede social é controlada pelo governo chinês e pelo Partido Comunista da China (PCCh) e tem acesso aos dados sigilosos de todo cidadão americano, ameaçando a segurança nacional.
Outro argumento, vindo diretamente do “túnel do tempo” da Guerra Fria, defendido pelos congressistas do império, é que o TikTok faz “doutrinação ideológica comunista” na juventude yankee que consome seu conteúdo. Tais afirmações estão sempre presentes nos discursos e Fake News da extrema-direita, não só nos Estados Unidos como também no resto do mundo, sendo um padrão de ataque e desinformação estratégica dos movimentos fascistas contrários ao povo trabalhador.
A perseguição ao TikTok não é novidade e foi tentada pelo ex-presidente do EUA, Donald Trump, em 2020, avançando novamente no Congresso americano em 2024. Mas parece que, desta vez, o candidato republicano mudou de lado, alegando que banir a rede social de vídeos curtos “alienaria” os jovens americanos e daria ainda mais poder à Meta, dona do Facebook. Ou seja, em ano eleitoral no País, as opiniões dos candidatos mudam de direção como “bandeiras ao vento”, de acordo com os interesses de campanha de cada um, visando abocanhar um número maior de possíveis eleitores.
O Congresso americano sequer consegue aprovar uma Lei Geral de Proteção aos Dados do cidadão, uma LGPD dos EUA (que tramita nos corredores do parlamento sem avançar já faz bastante tempo), porque isso criaria um imbróglio com as grandes corporações de comunicação e redes sociais americanas, fato que nenhum político quer que aconteça, principalmente em ano eleitoral. Eliminar a concorrência chinesa parece um caminho mais oportuno.
O certo é que os EUA podem sim proibir um aplicativo de operar em território nacional, desde que o Congresso consiga provar que o TikTok é uma ameaça legítima e séria à privacidade e segurança nacional do País. Porém, chegar nesse ponto é algo bem difícil, pois vai de encontro ao direito dos americanos previsto na Primeira Emenda da Constituição, que garante a liberdade de expressão. A ação também vai depender das consequências dessa “pataquada” no mercado financeiro, já que a rede social chinesa conta com 170 milhões de usuários nos Estados Unidos e tem um valor de venda perto dos US$ 230 bilhões, com poucas empresas com condições de pagar esse preço. Potencialmente, apenas as gigantes da tecnologia, Microsoft, Google e Meta (dona do Facebook, Instagram e WhatsApp) teriam condições de fazer a transação.
Quando se trata de garantir os lucros e monopolizar a hegemonia tecnológica, comercial e cultural de alguma iniciativa, discurso ou negócio, os EUA, representantes majoritários do imperialismo capitalista, sempre se superam. E a pergunta que não quer calar: qual seria a posição do imperialismo caso algum país, qualquer país, questionasse alguma de suas corporações? E se algum outro governo (a Venezuela, por exemplo) obrigasse a Meta, o Google ou o Twitter (atualmente X) a vender suas ações para as empresas nacionais ou, do contrário, seriam retiradas daquele país sob as mesmas acusações de espionagem e/ou doutrinação ideológica, por colocar em risco a segurança nacional, o que aconteceria?
Pau que bate em Chico bate em Francisco?
Sabemos bem a resposta.
Foto: REUTERS/Evelyn Hockstein