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Porque precisamos falar sobre mineração e soberania?

Ocorreu na Faculdade UnB Planaltina (FUP), entre os dias 24 e 30 de setembro de 2018, os eventos “Semana de Extensão Universitária da Universidade de Brasília” (UnB) e a 7ª etapa do Curso de Realidade Brasileira (CRB). Professores/as, estudantes e militantes de movimentos sociais pautaram o debate sobre a questão mineral para a sociedade brasileira. As discussões aconteceram com ações articuladas com o Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), que problematizam sobre o impacto da mineração na perspectiva econômica, social e ambiental para a sociedade brasileira.

Na mesa realizada no dia 27, o tema abordado foi a luta pela terra e território no Brasil e os desafios da atual conjuntura. O debate contou com a participação da representação indígena, do MAM, Movimento Sem-Terra (MST) e da Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas (Conaq). No dia seguinte, foi debatido sobre bens naturais, soberania e sociedade. Estiveram presentes o ex-diretor da Petrobras, Guilherme Estrella; o professor emérito da UFSC, Luiz Fernando Scheibe; Marcelo Firpo Porto, pela Fiocruz; Charles Trocate, do MAM, e Fabíola Antezana, da Plataforma Operária e Camponesa para Energia. Dentre os temas abordados, destacaram-se a importância da gestão e do controle social do petróleo, da água e minérios, ressaltando que o Brasil é o único país com tecnologia para retirada de petróleo em águas profundas e da camada do pré-sal, e a necessidade de se ter uma política de gestão de recursos hídricos que não permita a privatização de nossos bens.

As reflexões que permeiam esse debate recaem sobre a questão da soberania nacional em relação ao uso da natureza. Para isso, é preciso recuperar que a história brasileira está marcada por mais de 400 anos de mineração. Estudiosos dividem esse processo em dois grandes ciclos: o primeiro aconteceu no período colonial, centrado na exploração de ouro e pedras preciosas; o segundo se inicia em meados do século XX, tendo o minério de ferro como principal produto a ser extraído e exportado. Em nenhum desses momentos o povo brasileiro obteve êxito em imprimir um maior controle sobre a extração de um dos mais estratégicos bens naturais do país – os minérios.

Historicamente, a participação brasileira acontece na lógica de subordinação ao sistema econômico mundial, que tem como principal característica a exploração da força de trabalho da classe trabalhadora, o uso intenso dos bens naturais e um grande impacto ambiental. Assim, o Brasil se mantém como exportador de matérias-primas comprometendo a soberania nacional. Porém, vale ressaltar que esse processo não acontece sem resistência e sem uma defesa das organizações sociais e dos trabalhadores na perspectiva de defender a soberania em seus diversos aspectos, desde os seus bens naturais até das entidades estatais existentes.

A defesa da soberania passa pela desafiadora tarefa de, primeiramente, reconhecer que somos um país minerado, explorado por multinacionais que extraem o minério e enviam para fora do país. É no Norte do Brasil, sobretudo, que camponeses, nas suas mais diversas faces (quilombola, indígena, ribeirinha, cabocla, etc.) acirram a luta contra os projetos de exploração e escoamento da mineração – isso ocorre desde o final dos anos de 1990.  Esses são os setores mais prejudicados pelo desapossamento territorial de um capital em crise estrutural, que encontra na natureza (terra, água, minério) uma acumulação extraordinária para a manutenção de seus lucros.


Mineração: máquina de moer gente


A mineração é o setor que mais mata, mutila e enlouquece trabalhador no Brasil. Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a mineração é um dos campos mais perigosos para se trabalhar. Para a OIT, a indústria extrativa é que mais oferece riscos de acidentes, pois é a que menos oferece medidas de segurança aos trabalhadores.

As péssimas condições de sobrevivência são reproduzidas nos arredores das minas, especialmente para crianças e mulheres. Nos locais onde elas se instalam, registra-se o aumento da prostituição, da violência contra as mulheres (inclusive de abuso sexual), aumento de doenças, de contaminações diversas (mercúrio, arsênio, cianeto, etc.), dentre outros aspectos.

A flexibilização das leis trabalhistas, exploração da forma de trabalho e diminuição dos investimentos na infraestrutura são resultados da superexploração das mineradoras. Elas destroem as comunidades indígenas e quilombolas causando a degradação e morte dos rios, como no caso do rompimento da Barragem de Fundão em Mariana, Minas Gerais.

Na perspectiva econômica os prejuízos para a sociedade brasileira não são menores, pois com a aprovação da Lei Kandir (Lei Complementar nº 83, de 1996) todo produto primário de exportação fica isento de tributação.

Esta lei representa um dos maiores prejuízos de arrecadação de estados e municípios. Minas Gerais, o maior estado minerado do Brasil, deixou de arrecadar R$ 135 bilhões, aproximadamente, com o impacto da Lei Kandir na exploração do minério. Este valor faz parte dos lucros das multinacionais que além de se apropriar dos bens naturais, acumulam lucros exorbitantes com isenções fiscais.

Por fim, o impacto ao meio ambiente, além da destruição da fauna e flora, da morte dos rios, do envenenamento das águas e do alto consumo de água para beneficiamento e escoamento do minério através de minerodutos, representa um grande saldo negativo para o povo brasileiro. A Anglo American em Conceição do Mato Dentro (MG) consome 5.023.000 litros de água por hora para escoamento do minério.

Soma-se a isso a expulsão dos camponeses de suas terras, que se tornam inapropriadas para a sua sobrevivência. Após a “tragédia” de Mariana, por exemplo, os camponeses vivem assustados pelo medo do rompimento das barragens de rejeito.


Em defesa da soberania


É preciso envolver toda a população no debate sobre as consequências da superexploração mineral, realizada pelas multinacionais. As empresas apresentam a mineração como progresso, gerando uma grande contradição, vez que a própria população (explorada) vê a mineração como positiva, sem reconhecer os prejuízos que ela gera às comunidades e municípios. Cria-se a “minero-dependência”, quando os municípios minerados têm sua economia totalmente dependente da mineração, fazendo com que a própria população defenda a presença das empresas exploradoras em que pese todos os prejuízos causados.

Se, por um lado, faz-se necessário reconhecer que a extração mineral é necessária ao desenvolvimento de diversos produtos indispensáveis à população, por outro, é muito importante o debate sobre a soberania, no que se refere à extração do minério. O que se tem assistido é a entrega total das nossas riquezas minerais nas mãos de multinacionais que visam apenas o lucro. É necessário reafirmar a soberania popular como forma de organização da classe trabalhadora para defender seu maior patrimônio natural, sem com isso, explorar os trabalhadores e destruir o meio ambiente.

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