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Inconstitucional, intervenção no Rio aprofunda Estado de exceção

No último dia 16 de fevereiro, o presidente golpista, Michel Temer, atentou mais uma vez contra os direitos da população e decretou uma intervenção militar no Rio de Janeiro. Essa é a primeira vez que tal medida é imposta desde a promulgação da Constituição Federal de 1988. De acordo com o decreto, o general do Exército, Walter Souza Braga Netto, chefe do Comando Militar do Leste, assumiu como interventor, tomando o lugar do secretário de Segurança do estado, Roberto Sá. Assim, o militar passou a controlar as polícias civil e militar e os bombeiros, não se sujeitando às normas jurídicas que conflitarem com as medidas necessárias à execução da intervenção (art. 3º, § 1º do Decreto). Ou seja, o Interventor militar tornou-se autoridade superior ao governador.

A medida representa o aprofundamento do golpe de Estado que está sendo imposto no Brasil, cuja primeira medida foi retirar uma presidenta eleita sem qualquer amparo legal. A própria intervenção foi um ato inconstitucional, em mais uma demonstração de que longe de um Estado democrático de direito, o Brasil vive um Estado de exceção.

A intervenção federal está prevista na Constituição como uma medida de natureza extremamente excepcional, no entanto, ela não autoriza a substituição de um governo civil por um militar, conforme descrito no artigo 21, inciso V, da Constituição. “A intervenção trata da substituição temporária e excepcional de uma autoridade estadual civil por uma federal civil. Não de uma autoridade civil por uma militar. O interventor tem poderes de governo, e governo, pela Constituição, até agora, só é civil", afirmou a advogada e professora de Direito Constitucional da FGV Direito SP, Eloísa Machado.

 O Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional sequer foram procurados para se pronunciar sobre a intervenção, como determinam os artigos 90, inciso I, e 91, parágrafo 1º, inciso I.

Em nota, o Conselho Nacional de Direitos Humanos afirmou que a intervenção é uma “licença para matar”, além de aprofundar “a ruptura com a institucionalidade democrática do país, com o estado de exceção, e traz graves ameaças à estabilidade democrática e, consequentemente, aos direitos humanos"; "As violações de direitos humanos serão ainda mais agravadas pela possibilidade de impunidade resultante da Lei n° 13.491/2017, que define a Justiça Militar da União como o foro competente para julgar os membros das Forças Armadas que cometerem crimes dolosos contra a vida de civis".


Caçada contra pobre, preto e favelado


A ação do Exército no Rio de Janeiro, nesse momento, tem alvo certo: os pobres, pretos e favelados. As cenas de abuso de poder e violação de direitos elementares dão a tônica das operações policiais.  A população trabalhadora pobre e preta que vive nas favelas é suspeita de antemão. Até mesmo as crianças estão sendo revistadas no caminho para a escola.

O ministro da Defesa, Raul Jungmann, chegou a defender a necessidade de mandados de busca e apreensão e captura coletivo, que poderiam abranger desde uma rua inteira até “uma área, um bairro”. “Na realidade urbanística do Rio de Janeiro, você muitas vezes sai com uma busca e apreensão numa casa, numa comunidade e o bandido se desloca. Então, você precisa ter algo que é, exatamente um mandado de busca e apreensão e captura coletivo, que já existiu, que já foi feito em outras ocasiões, ele precisa voltar para uma melhor eficácia do trabalho a ser desenvolvido (...). Em lugar de você dizer, por exemplo, rua tal, número tal, você vai dizer, digamos uma rua inteira, uma área, um bairro. Aquele lugar ali é possível de ter um mandado de busca e apreensão dentro de todos os procedimentos legais (...). Não há nenhuma carta branca, carta negra, carta cinza. Quero dizer que isso é uma ordem judicial, que já foi empregada outras vezes no Rio de Janeiro, e que obviamente nós estamos peticionando que volte a ser utilizado em alguns lugares", declarou o ministro.

Trata-se de uma grave violação ao direito à moradia dos favelados. As pessoas terão suas casas invadidas pela polícia pelo simples fato de serem pobres e morarem em comunidades carentes. Vale destacar que tal medida pode facilmente se espalhar e, na prática, qualquer casa poderá ser invadida por policiais.

Como bem destacou a nota do Conselho Nacional de Direitos Humanos, “A atuação das Forças Armadas é historicamente marcada pelo aumento do número de violações de direitos, operando na lógica do ‘combate ao inimigo’ e, segundo essa lógica, a população negra, pobre e moradora de favelas e periferias é quem tem sido ‘combatida’ pelas tropas do Exército, da Marinha e da Aeronáutica (...). As abordagens às moradoras e moradores, cidadãs e cidadãos, trabalhadoras/es, negras/os e vulnerabilizadas/os, especialmente mulheres e crianças, com o emprego de violência e força desproporcional, só revelam o desacerto do uso das Forças Armadas no policiamento ostensivo, que se soma à mesma lógica empregada pela Polícia Militar desse estado que, entre 2010 e 2016, resultou em 4.362 mortes decorrentes de ação policial”.


Ditadura Militar à vista


O país vive um risco efetivo de um novo golpe militar. Usando como desculpa o suposto combate ao crime, o Rio de Janeiro sempre foi usado pela burguesia como uma espécie de “laboratório” para as medidas mais repressivas.

Não por acaso, o comandante do Exército, o general Eduardo Villas Bôas, declarou durante uma reunião dos conselhos nacionais da República e da Defesa que os militares necessitariam de “garantias” para agir no âmbito da intervenção “sem o risco de surgir uma nova Comissão da Verdade”. O militar fez referência à comissão aprovada ainda no governo Dilma, que investigou as graves violações de direitos humanos, especialmente no último regime militar. Importante destacar que no relatório de conclusão da Comissão, apresentado em 2014, 377 pessoas foram apontadas como responsáveis pelos abusos, mas não puderam ser julgadas até o momento por conta da vigência da Lei da Anistia.

O absurdo é tamanho que os moradores das favelas estão sendo “fichados” pela polícia durante as operações. De acordo com os relatos dos jornais burgueses, os moradores das comunidades da Vila Kennedy, da Vila Aliança e da Coreia, na Zona Oeste, estão sendo fotografados pelos agentes da Polícia no momento em que apresentam seus documentos de identificação. A prática, o crime de constrangimento ilegal, remete a práticas utilizadas durante a Ditadura Militar, segundo a Defensoria Pública do estado. Conforme a própria imprensa burguesa destacou, a população local está se recusando inclusive a sair de suas casas com medo das ações.

O que está se vendo é o aprofundamento da crise e uma repetição trágica da história. Como sempre, diante de um colapso econômico de grandes proporções, as saídas utilizadas pelo imperialismo são as ditaduras, guerras civis ou o fascismo. Para a classe operária não haverá outra saída que não a de enfrentar seus algozes. O golpe vem evoluindo e segue, em todo o mundo, para a repressão aberta. A farsa da democracia burguesa já se esvaiu completamente. O capitalismo é um Estado de exceção para garantir os interesses de uma parcela ínfima de parasitas, enquanto mantém o restante da população vivendo em condições miseráveis. A ação direta das massas se faz mais urgente ainda. É socialismo ou barbárie.

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