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Dois meses de intervenção militar: prisões coletivas, execuções, chacinas e mais repressão

Passados dois meses da intervenção militar decretada pelo presidente golpista, Michel Temer (MDB), o ‘Observatório da Intervenção’ – uma iniciativa do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes (CESeC/Ucam), que tem como objetivo “acompanhar e divulgar os desdobramentos, os impactos e as violações de direitos decorrentes da intervenção federal no estado do Rio de Janeiro a partir da documentação e da análise criteriosa sobre fatos e dados” – divulgou um primeiro balanço. De acordo com os estudos, entre o período de 16 de fevereiro a 16 de abril de 2018, o número de chacinas (quando é constatada a morte de três ou mais pessoas no mesmo evento) dobrou em virtude da ação militar: foram 12 nos últimos dois meses, contra seis registradas no mesmo período do ano passado. O total de vítimas dessas chacinas aumentou em mais de 400% - passando de 12 para 52.

Também ficou constatado um aumento de aproximadamente 20% no número de tiroteios registrados no estado logo após o anúncio da intervenção. Ao todo foram 1.502 trocas de tiros, 203 tiroteios a mais do que os 1.299 registrados nos dois meses pré-intervenção. A capital carioca lidera o ranking, com 892 tiroteios, 114 mortos e 105 feridos no período. Em segundo lugar aparece São Gonçalo, com 160 trocas de tiros, 53 mortos e 31 feridos, seguido do município de Belford Roxo, que enfrentou 123 ocorrências, 19 mortos e 12 feridos. Nesses 60 dias de intervenção, 209 pessoas foram executadas pela polícia. 

Outro dado alarmante são os valores da intervenção. Segundo o relatório, “Semanas depois de tomar posse, o interventor anunciou que sua equipe havia calculado os custos da intervenção em R$ 3,1 bilhões. Deste montante, R$ 1,6 bilhão seriam destinados a quitar dívidas de 2016 e 2017; e R$ 1,5 bilhão, para o custeio de ações e despesas de 2018. Chama atenção o alto valor da dívida, resultado de atrasos na folha salarial e no pagamento de fornecedores. Não seria o caso de realizar uma auditoria sobre o setor de Segurança e o sistema prisional do estado, para tornar públicos a origem do déficit, os principais débitos e a programação de pagamento? Não se tem notícia de esclarecimento do tipo. Também é impressionante a solicitação de R$ 1,5 bilhão de verbas extras para 2018, sem que seja apresentado um plano para uso desses recursos. Note-se que o Rio de Janeiro já é o segundo estado em termos de investimento per capita em segurança pública, superado apenas por Roraima. Segundo dados do Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2016 o Rio de Janeiro gastou no setor R$ 550 por habitante; São Paulo investiu R$ 245; Minas Gerais, R$ 423. Até meados de abril, o governo federal só se comprometeu com o valor da Medida Provisória nº 825, que em 27 de março alocou um crédito extraordinário de R$ 1,2 bilhão para ‘ações decorrentes da Intervenção Federal no Estado do Rio de Janeiro’. Pela MP, sabe-se apenas que R$ 900 milhões serão para despesas correntes (de gasolina a munição, tudo o que não incluir salários) e R$ 300 milhões para investimentos (aquisição de equipamentos e carros, por exemplo)”.


Mandados e prisões coletivas é a ordem


Logo após decretar a Intervenção Militar, diversas medidas foram tomadas no sentido de acabar com os direitos civis mais básicos da população. Em fevereiro, por exemplo, o ministro Raul Jungmann relatou que o Exército pretendia usar mandados coletivos de busca, apreensão e até de prisão. Tal medida foi defendida pela Advocacia Geral da União. No entanto, a pressão popular fez com que o governo recuasse legalmente, mas, na prática, todas essas ações foram realizadas. Foi o caso da operação realizada na favela Kelson’s, no dia 20 de fevereiro, onde militares revistaram mochilas de crianças uniformizadas a caminho da escola. O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) chegou a emitir uma nota apontando a violação do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Já no dia 23 de fevereiro, durante a primeira operação na Vila Kennedy, Vila Aliança e Coreia, os militares realizaram abordagens aleatórias em moradores, fotografando-os junto aos seus documentos de identificação. Segundo o relatório do “Observatório”, as imagens seriam remetidas para a Polícia, para suposta checagem de antecedentes criminais. “A OAB-RJ e a Defensoria Pública do Rio de Janeiro reagiram, lembrando que o Código Penal exige que as abordagens sejam baseadas em elementos objetivos e que o procedimento colocava toda a comunidade como suspeita”.

O caso mais absurdo, no entanto, foi o das prisões coletivas contra supostos milicianos. No último dia 7 de abril, a Polícia Civil invadiu uma festa pública em Santa Cruz, zona oeste do Rio de janeiro, e prendeu 159 homens por supostamente integrarem a maior milícia do estado – conhecida como “Liga da Justiça”. Eles foram acusados de constituir milícia privada e de ter a posse ou porte de arma de fogo de uso restrito e tiveram suas prisões em flagrante convertidas em preventiva, em audiência de custódia. Ocorre que na decisão não foram sequer detalhadas as razões para a prisão de cada indivíduo — algo previsto pelo artigo 285 do Código de Processo Penal. Para justificar as prisões, a Polícia Civil, num cinismo sem fim, alegou haver “certeza visual”. Tal tese foi duramente criticada pelo subcoordenador de Defesa Criminal da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, Ricardo André de Souza, que declarou: “Eu queria entender como se pode falar em certeza visual quando estava ocorrendo uma festa aberta ao público, anunciada na rádio. É muito porosa essa situação de que haveria ali um estado de flagrância. Até porque as armas não foram encontradas com ninguém específico. O que falta é a especificação pormenorizada dos detalhes e a individualização da conduta de cada um”.

Ainda segundo a Defensoria, a Polícia Civil entregou um documento à desembargadora responsável por avaliar os pedidos de Habeas Corpus dos 159 presos, constatando que 139 deles não era alvo de qualquer investigação, que não havia inquéritos em andamento, tampouco registros de anotações policiais sobre a participação dos acusados em grupo criminoso, “especialmente em milícia, ou correlatas”. As 139 pessoas foram soltas, entre eles o artista de circo, Pablo Martins, de 23 anos, que mora na Europa e estava passando férias no Rio. 


Organizar os trabalhadores para barrar o avanço da direita


As chacinas, execuções e prisões arbitrárias sempre foram utilizadas pelo Estado burguês e seus órgãos repressivos. Com o aumento da crise, tais medidas passaram a ser utilizadas de forma mais ostensiva, sem “mascaramento”. Ou seja, estamos caminhando para um período de terror aberto contra as massas.

O que está sendo feito no Rio de Janeiro é uma espécie de laboratório para o que se pretende aplicar de forma organizada em todo o Brasil, que é o aumento da repressão e do massacre contra a população trabalhadora.

A crise está fazendo com que os governos retirem cada vez mais direitos da população, que, por sua vez, irá reagir contra esses ataques. Portanto, a burguesia precisa intensificar os aparatos repressivos para conter a revolta popular.

Contra essa ação direta dos governos burgueses, os trabalhadores e a população pobre não têm outra saída que não se organizar coletivamente, denunciar a repressão e compreender que é preciso lutar pela constituição do governo dos trabalhadores da cidade e do campo.

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