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População vence e projeto contra a criminalização do aborto é aprovado na Argentina

O Projeto de Lei contra a criminalização do aborto foi aprovado pela Câmara de Deputados da Argentina no último dia 14 de junho. O projeto prevê a   legalização do aborto seguro, livre e gratuito para as mulheres até a 14ª semana de gestação, em qualquer circunstância. A mudança na lei recebeu 129 votos a favor e 125 contrários.

Pela primeira vez na história da Argentina o tema foi debatido no Parlamento, resultado de uma forte pressão da mobilização popular, principalmente o movimento das mulheres, que pautou o debate e fez sentir o clamor pela legalização do aborto. Na Câmara, o debate estendeu-se por dois meses e meio. A votação em si durou 23 horas e foi acompanhado de perto por movimentos contra e a favor, que fizeram uma vigília ao redor do parlamento, sendo que o número de defensores do projeto era quatro vezes maior aos que eram contra. Ao mesmo tempo, estudantes tomaram várias escolas em Buenos Aires para apoiar a despenalização do aborto, através de uma vigília. A votação foi transmitida online e o país inteiro pode acompanhar.

O projeto agora segue para o Senado que tem maioria peronista, ou seja, é mais conservador. Segundo o jornal argentino Clarín, isso deverá acontecer até o mês de setembro. O presidente Mauricio Macri se declara contra a medida, mas reafirmou diversas vezes que se caso a legislação passasse pelo Congresso ele não vetaria – respeitaria a decisão do legislativo.

Segundo uma matéria publicada no jornal El País Brasil, “Ao todo, houve mais de 700 expositores, a favor e contra, em audiências públicas que duraram semanas e foram televisionadas (...). Três ministros da Saúde (o atual, do governo Macri, e dois ex-ministros de Néstor e Cristina Kirchner) expuseram suas opiniões nas audiências públicas prévias à sessão e defenderam a legalização do aborto com dados e estatísticas que mostram que é uma questão urgente para a saúde pública. Os ministros explicaram que a proibição do aborto não reduz sua prática, que o aborto clandestino é a principal causa de mortalidade materna e que os países que legalizaram reduziram não só esse índice, como também, inclusive, o número de abortos”.

Segundo cifras oficiais citadas pela agência France Presse, 17% das 245 mortes de mulheres grávidas na Argentina, registradas em 2016, ocorreram por abortos. Conforme os dados apresentados pelo deputado Alejandro Ramos (Primero Argentina), ao menos 370 mil abortos são realizados anualmente no país. Já os números do Sistema de Saúde Argentino mostram que cerca de 500 mil abortos clandestinos são realizados por ano e, desses, 60 mil acabam em complicações.

Diversos deputados que votaram a favor da legalização do aborto se pautaram em um dos médicos mais famosos do país, René Favaloro, que possui um trabalho extremamente sério e importante, no qual afirma que: “legalizar não quer dizer autorizar que todo mundo faça um aborto só porque é legal".



Crise na Argentina




A lei que legaliza o aborto não foi aprovada simplesmente por “boa vontade” do parlamento, que poderá caminhar à esquerda. Trata-se do reflexo de uma intensa mobilização popular, que vem se intensificando conforme a crise do país aumenta e crescem os ataques contra a classe trabalhadora. A resposta popular é a tendência à revolta das massas.

Maurício Macri colocou em pé uma frente de vários partidos burgueses, desde a esquerda até a direita, para se eleger e impor toda uma série de ataques contra as massas. Um mês após ter começado a governar por meio de decretos, a crise é monumental. O endividamento em cima dessa política disparou, aumentando em mais ou menos 30% nos últimos 18 meses, ou seja, mais de US$ 60 bilhões. A pobreza eclodiu e a situação é calamitosa para a classe trabalhadora e para a pequena-burguesia do país.

Porém, o imperialismo norte-americano está com muitas dificuldades para avançar na América Latina por meio desses “regimes democráticos” de direita. Macri, na Argentina; Temer, no Brasil; Peña Nieto, no México; Juan Manuel Santos, na Colômbia (e o mesmo ocorrerá ao seu sucessor) etc., enfrentam duríssimas e crescentes crises devido à impopularidade de suas medidas.

Para que Macri se mantenha no poder e o imperialismo fortaleça sua política, hão de se fazer muitas concessões com as massas que, em momentos de crise, tendem a avançar para a esquerda com a força motriz da luta, contra a investida da direita e os ataques que os imperialistas impõem.

O avanço das massas não é algo metafísico: a mesma direita que bate e recrimina é a força que coloca a revolta em pé. Por esse motivo, a tendência dos governos é preparar terreno onde um regime ditatorial militarizado seja imposto e, com isso, que a crise mundial seja minimamente contida (dentro do possível) e a burguesia sustentada no poder.



O caminho é a luta



A pressão popular na Argentina mostrou que mesmo diante do endurecimento do regime político é possível avançar em algumas questões democráticas. Mas essa vitória somente será consolidada por meio da organização e da luta da população trabalhadora.

Conforme destacou a representante da Frente de Esquerda dos Trabalhadores Argentinos, Romina del Plá, do Partido Obreiro (PO), o debate não é simplesmente sobre facilitar o aborto, mas sobre “uma proposta abrangente para legalizar o aborto até 14 semanas de gestação, que propõe a criação de ministérios, que apela para a implementação da educação sexual e contracepção contra a proposta de setores clericais para manter tudo como está agora, incluindo as mortes de mulheres jovens e mutilações de milhares de mulheres grávidas”.

Ainda segundo del Plá, as “Pesquisas, pronunciamentos públicos de diferentes setores (da cultura, grupos de profissionais, etc.) e a mobilização de ruas são responsáveis pela adesão majoritária ao aborto legal em toda a sociedade. Aqueles que ameaçaram com um referendo, hoje, são silenciosos na rádio sobre o assunto, porque onde iniciativas deste tipo foram realizadas, como no movimento estudantil, houve uma maioria esmagadora pronunciando porque o aborto é lei. E assim será visto novamente com as fotos de escolas e faculdades que mostram uma juventude decidida na luta por seus direitos (...). Essa luta será vencida na rua".

O avanço visto na Argentina deve ser seguido por toda a América Latina. Guiana, Cuba, Uruguai e agora Argentina são os únicos países da América Latina em que o aborto é permitido. Cerca de 90% das mulheres em idade reprodutiva dessa região vivem em países com leis que restringem o aborto. Em seis deles − El Salvador, Honduras, Haiti, Nicarágua, República Dominicana e Suriname −, a interrupção voluntária da gravidez é completamente proibida. Não é permitida nem mesmo para salvar a vida da mulher, como no famoso caso de Rosaura − conhecida como Esperancita.

É preciso intensificar a luta e arrancar todos os direitos democráticos da população, entendendo-os como uma ponte para o avanço real da sociedade, ou seja, para a evolução desse sistema social que está caindo aos pedaços, que é o capitalismo, para uma sociedade mais justa e igualitária, rumo ao socialismo.

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