Foi divulgado no último dia 24 de outubro, um manifesto da bancada evangélica que propõe, entre outras barbaridades, a extinção do Ministério da Cultura. O tal “manifesto à nação” apresenta uma série de propostas que atacam diretamente a liberdade e o direito de expressão, além de incentivar a censura nos meios artístico-culturais, na imprensa e também nas escolas.
A Frente Parlamentar Evangélica, também conhecida bancada evangélica, uma das principais bases de apoio do próximo presidente (foram 180 parlamentares eleitos este ano), lançou uma lista de propostas reacionárias, em total consonância com as ideias defendidas pelo capitão da reserva, que vai desde a extinção de ministérios, como o da Cultura e o da Ciência e Tecnologia, até a instituição do "ensino moral" e da famigerada “escola sem partido”, um verdadeiro atraso para a sociedade brasileira.
A reboque dessa onda de ataques aos direitos e às “liberdades democráticas” que ainda sobreviviam no País, os fanáticos seguidores do futuro presidente, representante da extrema-direita, criaram uma campanha nas redes sociais pedindo um boicote aos artistas que foram contra “o coiso”.
Os apoiadores do presidente eleito estão convocando internautas, via WhatsApp, a boicotarem diversos artistas, intelectuais e jornalistas que se posicionaram contra o político durante a campanha eleitoral.
A mensagem disseminada pelo aplicativo reúne mais de 700 nomes que assinaram o manifesto “Democracia Sim” e que, de acordo com a nefasta campanha, são “Artistas que se manifestaram contra a vontade do povo, pois mamam do dinheiro público!”.
O manifesto “Democracia Sim” reuniu mais de 190 mil assinaturas, entre famosos e anônimos, e teve como mote a ameaça que a vitória de Jair Bolsonaro representaria à democracia brasileira, afirmando em sua página oficial que “Podemos divergir intensamente sobre os rumos das políticas econômicas, sociais ou ambientais, a qualidade deste ou daquele ator político, o acerto do nosso sistema legal nos mais variados temas e dos processos e decisões judiciais para sua aplicação. Nisso, estamos no terreno da democracia, da disputa legítima de ideias e projetos no debate público (...). É preciso dizer, mais que uma escolha política, a candidatura de Jair Bolsonaro representa uma ameaça franca ao nosso patrimônio civilizatório primordial. É preciso recusar sua normalização, e somar forças na defesa da liberdade, da tolerância e do destino coletivo entre nós”.
A lista de pessoas que assinam o manifesto em questão traz desde cantores (as) como Anitta, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Mano Brown e Chico Buarque até nomes da TV e do cinema como Camila Pitanga, Patrícia Pillar, Mel Lisboa, Fernanda Lima, Wagner Moura, Alexandre Nero, Fernando Meirelles, Walter Salles, incluindo ainda o médico Dráuzio Varella e jornalistas como Juca Kfouri, Eugênio Bucci, Zeca Camargo e Bruno Torturra, entre outros tantos.
Segundo o defensor público federal e presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef), Igor Roque, os citados na lista podem entrar com processos por ofensa à honra subjetiva e objetiva contra as pessoas que espalharam as mensagens. Cezar Britto, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), explica ainda que ofensas, mesmo em grupos fechados no WhatsApp, podem render processos judiciais.
Outro claro sinal de arbitrariedade e ataque às liberdades de expressão artística e cultural foi a declaração do futuro presidente adepto do fascismo, afirmando que irá fiscalizar de perto a agenda intelectual e cultural do estado da Bahia.
Além da hipótese de boicote político ao governo oposicionista de Rui Costa (PT) e dos ataques contra, tentativa de isolamento etc., a presidenta do PSL na Bahia, Dayane Pimentel, deixou claro que o futuro chefe da nação promoverá a censura e caça às bruxas contra os artistas e intelectuais.
“O Bolsonaro vai ser o grande fiscalizador cuidando da agenda cultural e intelectual. Essa apologia à ideologia de gênero e doutrinação escolar por meio dos direitos humanos terá fiscalização (...). Essa será uma questão temática para o boicote, nesses termos, para favorecer a sociedade”, comentou Pimentel.
A deputada federal, eleita nas eleições de 2018, voltou a defender que as manifestações culturais precisam de “melhora” e afirmou que “Tendo em vista as questões ideológicas culturais, defendemos que os governos esquerdistas têm as piores perspectivas. Não estamos aqui para fazer boicote para essas questões, mas promover melhoria. Para fazer oposição aos esquerdistas e esse pessoal vai fazer oposição a nós”, justificou.
Não bastasse o intenso ataque aos artistas que se opõem ao futuro presidente, um verdadeiro linchamento virtual de jornalistas durante o processo da eleição alerta para risco à liberdade de imprensa que se desenha para o próximo período.
Existe um clima de apreensão entre os jornalistas brasileiros com a chegada do governo do capitão presidente. O novo chefe da nação eleito e seu grupo mais próximo assumiram a postura de embate com profissionais e veículos que façam reportagens contrárias a eles, imitando a estratégia adotada pelo presidente americano, Donald Trump, e começam a assumir o jargão preferido do presidente imperialista, “fake News”, para classificar as notícias que eles sintam como desfavoráveis ao seu governo.
As mentiras dos eleitores de Bolsonaro sobre a Lei Rouanet
Outro foco de ataques após um manifesto de diversos artistas contrários a Bolsonaro (PSL) tem sido a Lei Rouanet. O futuro presidente e vários de seus assessores e eleitores acusaram os profissionais de trocarem apoio político por dinheiro para financiar projetos culturais.
O candidato criticou a lei e afirmou em sua página oficial que, se eleito, vai acabar com os milhões de dinheiro público financiando 'famosos' sob o falso argumento de incentivo.
O posicionamento do capitão da reserva e ex-deputado, desencadeou uma onda de notícias e informações falsas sobre a Lei Rouanet, tentando desqualificar a lei de incentivo e jogar a opinião pública contra a lei e os artistas por ela contemplados.
O que é a Lei Rouanet, alvo das fake News criadas por Bolsonaro?
Principal mecanismo de fomento à Cultura do Brasil, a Lei 8.313/91 ou Lei Rouanet, como é conhecida, instituiu o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac). A lei estabelece as normativas de como o Governo Federal deve disponibilizar recursos para a realização de projetos artístico-culturais.
A Lei foi concebida originalmente com três mecanismos: o Fundo Nacional da Cultura (FNC), o Incentivo Fiscal e o Fundo de Investimento Cultural e Artístico (Ficart). Este nunca foi implementado, enquanto o Incentivo Fiscal - também chamado de mecenato - prevaleceu e chega a ser confundido com a própria Lei.
Sobre a aprovação de projetos, qualquer brasileiro interessado em conseguir apoio cultural, via Lei Rouanet, pode inserir um projeto no Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura (Salic), de forma eletrônica.
Em 2017, foram mais de cinco mil projetos aprovados. O investimento propiciado via renúncia fiscal de empresas e pessoas físicas destinado para produções culturais atingiu 1,1 bilhão de reais, sete milhões a mais do que no ano anterior.
A origem do dinheiro vem das empresas que optam por investir nos projetos. A Rouanet permite que 4% do valor recolhido no Imposto de Renda (IR) anual sejam destinados à cultura, a chamada renúncia fiscal. Esse dinheiro não sai diretamente do governo, apesar de ele ser público. As empresas que pagariam o IR de qualquer jeito, têm a possibilidade de incentivar a cultura do país.
É preciso modernizar a Lei Rouanet (que não sofre alterações desde que foi promulgada - embora já tenha recebido várias instruções normativas) visando promover cada vez mais avanços para atender e beneficiar realmente a população e o trabalhador brasileiro.
Também é certo que a Lei Rouanet não é perfeita e tem muitos detalhes para serem melhorados, mas precisamos combater de maneira intransigente as mentiras e as “fake news” amplamente divulgadas pela extrema direita fascista no intuito de acabar com a lei que por vezes fomenta os diversos movimentos artísticos culturais populares que questionam, resistem e enfrentam os governos ilegítimos, tiranos e golpistas.
Segmentos ligados a arte, cultura e economia criativa são tão significativos quanto os segmentos da indústria, do comércio e da prestação de serviços e apresentam-se com uma importância estratégica e com força suficiente para gerar impactos nas comunidades locais porque além de formar capital humano, estimula a diversidade, a tolerância e incentiva a resistência do cidadão e do trabalhador brasileiro contra os constantes ataques contra seus costumes e contra seus direitos.